AgirAzul Memória - Edição 11 - Comunidade quer a APA e a barragem do Gravataí
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AgirAzul 11

CAPA

Precisamos de Sol e ventilação natural!

A Prefeitura Municipal de Porto Alegre quer dinheiro para financiar a construção de casas populares, inclusive em áreas ocupadas que já deveriam estar destinadas a praças, e, para isto, deverá propor alterações substanciais no Plano Diretor atual que é de 1979.

Entre as possíveis modificações a está a construção de edifícios de 15 andares nas principais vias, através da venda do 'solo criado', o que daria fundos para os planos da Prefeitura; admissão de pequenos edifícios de até cinco andares sem elevador, e, em determinadas regiões, casas de até três pavimentos.

A indústria da construção civil de Porto Alegre, organizada no SINDUSCON, participa ativamente do trabalho propositivo das modificações e luta para tornar sem limite a altura das edificações. Em dezembro, o processo de discussão das propostas culminou no Congresso da Cidade cujos documentos finais deverão embasar a proposta de Lei complementar a ser enviada pelo Executivo ao Legislativo Municipal até março de 1996.

Porto Alegre, sempre úmida

Uma equipe de professores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS, foi contratada para prestar assessoria técnica às proposições. A professora-arquiteta, doutora Lúcia Mascaró, do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura - PROPAR, responsável pelos estudos técnicos sobre impactos ambientais, afirma que "se o adensamento pretendido não levar em conta a ventilação urbana e a dos edifícios, a ilhota térmica será cada vez maior e nós estaremos consumindo mais energia para viver confortavelmente*

Sua equipe saiu às ruas com câmeras fotográficas, termômetros, luxímetros e anemômetros para medir o ambiente urbano real: comprovaram que, no tipo de a cidade com a morfologia de Porto Alegre, com uma certa densidade de habitações e a latitude em que se localiza, a insolação de inverno inexiste, em alguns casos, para os primeiros pavimentos dos edifícios.

Com o aumento das alturas dos edifícios, continua Lúcia, "a situação será pior". "Quais as conseqüências disto?", ela pergunta, e responde: "Teremos a acentuação do frio e da umidade. Porto Alegre é sempre úmida. É muito provável que quem tenha dinheiro coloque ar condicionado ou calefação, agravando o problema do consumo de energia que no Rio Grande do Sul é seríssimo".

Continua a professora: "Na melhor das hipóteses, os vazios urbanos existentes (terrenos não ocupados e edifícios antigos de baixa altura em lugares não valorizados, que, portanto, vão ficar sem comprador) são apontados como um dos problemas atuais, mas talvez se tornem a grande salvação do clima da cidade, algo que supera a própria estratégia."

Lúcia Mascaró apresenta sua sugestão: "À medida que a situação já existe e vai se agravar, sugerimos que seja mantida aberta uma parcela de cada quarteirão e esta tem o valor de pelo menos 25% do perímetro do quarteirão e não precisa estar em único lote podendo distribuir-se em diversos lotes não utilizados".

Ela lembra a que a questão da ventilação urbana não foi ainda discutida e talvez nem seja antes do projeto ir à Câmara, o que é lastimável, porque isto ainda poderia salvar a habitabilidade e uso das edificações diminuindo consideravelmente o consumo energético. No verão, uma boa ventilação é o único meio de amenizar o calor naturalmente. Mas ressalta que "só favorecer a ventilação, não resolveria o problema da insolação, principalmente no inverno quando o sol está baixo e a sombra é muito profunda", É preciso também a radiação solar para secar a umidade característica de Porto Alegre (média anual de 70%).

Finalizando, Lúcia Mascaró afirmou ao AgirAzul que "a ventilação é a única forma de se quebrar o ciclo de poluentes na atmosfera (os carros são os maiores poluidores) quando tu não tens ventilação, a poluição favorece processo de inversão térmica: o espaço construído está quente e a poluição vai formar camadas por cima deste espaço. Com os edifícios mais altos, o fator de céu visível (a quantidade de céu visível do meio da rua) será pequeno e será mais difícil eliminar poluição".

O céu é o limite

O professor-engenheiro doutor Juan Luis Mascaró, também do PROPAR, é responsável pelos estudos das consequências técnicas e econômicas da densidade nos custos urbanos.

Ele concorda na necessidade de reformulação do Plano Diretor da cidade porque Porto Alegre é uma "cidade baixa", isto a é, a densidade atual de famílias por hectare não chega a amortizar o custo da infraestrutura oferecida como esgoto, rede elétrica, água, etc.

Segundo Juan, "a cidade, por um lado, precisa de uma densidade mínima para funcionar e, por outro, não deve ultrapassar densidades máximas"

Ele informa que estão sendo propostas densidades brutas na ordem de 10 a 120 economias por hectare, onde estes são os limites dentro dos quais a cidade funciona razoavelmente bem. "Mas a proposta não está sendo aceita pelo SINDUSCON", diz Mascaró. "O sindicato das construtoras não se conforma com o limite de 120 e quer um maior, mas não diz qual", "o fato que quando a densidade ultrapassa limite superior, aumentam os engarrafamentos das vias públicas, tanto a da superfície quanto a subterrânea e a carga das redes elétricas. Os transformadores tem que ser colocados em câmaras subterrâneas onde não se pode permitir nenhum alagamento, o que encarece o sistema de drenagem pluvial cria-se uma reação em cadeia que vai encarecendo todo o sistema",  argumenta o professor Mascaró.

"Estes prédios de 15 andares que estão sendo propostos podem ser bonitos, mas não são econômicos", diz o professor. "Ao contrário, são caros porque necessitam de proteção especial contra incêndios, elevadores mais velozes acabam exigindo uma infraestrutura mais sofisticada. Quem paga por isso é a CEEE, a CRT, a SMOV, que, enfim, transfere seus custos ao contribuinte, o próprio morador, mas não empresa construtora", diz Juan Mascaro.

"Em termos energéticos para a cidade de Porto Alegre, o ideal são  prédios de a 10 pavimentos, o que permite elevadores de baixa velocidade e custo, mas confortáveis. Isto torna possível a amortização do custo do edifício, e da infraestrutura da cidade que acaba sendo bem utilizada. Esta seria a tipologia indicada também para as classes mais populares. Mas que esta sendo proposto são edifícios de cinco andares sem elevador, o que causará, no mínimo, um grande desconforto aos usuários".  Os prédios de cinco andares com elevador são os mais anti-econômicos, não amortizam custo dos elevadores' fala o professor Juan.

E conclui: "a habitabilidade e a economia se tornam eficientes, quando fazemos com que os edifícios possam ser climatizados naturalmente e isto acontece quando eles têm alturas moderadas de forma a oferecer e manter condições adequadas de iluminação e ventilação natural. Isto é possível quando há um equilíbrio entre altura, afastamentos, distâncias e tudo o mais; e quando a densidade média não é ultrapassada, criando uma certa harmonia que deve ser distribuída a toda a cidade. Tem que se legislar para todo o povo da cidade, não só para quem pode pagar mais".

© 1992-1999 e 2007/2008 João Batista Santafé Aguiar - É proibida a reprodução total ou parcial sem permissão por escrito do autor ou detentor dos direitos.

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