AgirAzul Revista 1992-1998

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AgirAzul 12

Opinião

Haverá, realmente, desenvolvimento sustentável?

Por Almirante Ibsen de Gusmão Câmara*

Após a conferência do Rio em 1992, a expressão "desenvolvimento sustentável" passou a ser repetida. cansativamente, dando a impressão de que, mediante essa fórmula mágica, os conflitos inerentes ao desenvolvimento e à conservação da natureza estariam solucionados.

A questão não pode ser encarada dessa ingênua simplicidade e merece uma análise criteriosa que permita mostrar até que ponto é realmente possível conciliar desenvolvimento com preservação ambiental, permitindo, assim, a manutenção da diversidade biológica.

Desenvolvimento significa coisas distintas para pessoas diferentes. Os economistas costumam defini-lo como o crescimento do valor dos serviços e bens produzidos: outros, mais acertadamente, o consideram como sendo a melhoria das condições da vida humana em todos os seus aspectos. Mas, em qualquer caso, ele inevitavelmente implica o uso e consumo de recursos naturais.

Para atingir-se um desenvolvimento realmente sustentável, seria necessário que as sociedades humanas melhorassem suas condições de vida mantendo simultaneamente e por tempo indefinido, a vitalidade do planeta, seu patrimônio natural e a biodiversidade. Esta é uma meta a rigor inatingível, posto que, em muitos casos, usar recursos mostra-se incompatível com sua preservação, basta nos lembrarmos de que muitos deles não são renováveis, eles somente o são se utilizados de forma a permitir sua regeneração, o que nem sempre é exeqüível com os padrões de consumo de uma sociedade ávida de conforto.

Há, ainda, a considerar, dois pontos de relevante significação: o crescimento demográfico da humanidade e a conseqüente competição por espaço e alimentos com as demais formas de vida.

A Terra tem dimensões finitas e os processos que viabilizam a vida e sua diversidade estão submetidos a limitações que não podem ser ultrapassadas. O crescimento numérico da humanidade significa, forçosamente, a ocupação dos espaços utilizados por outros seres vivos e o consumo dos recursos que para eles são indispensáveis, tendo como conseqüências sua inevitável redução ou extinção.

Há, portanto, inegáveis contradições inerentes ao desenvolvimento e à conservação. A medida que a humanidade cresce e melhora as condições de vida, reduzem-se as possibilidades dos demais seres vivos e degradam-se, de uma forma ou de outra, as condições ambientais.

Desenvolvimento totalmente sustentável é, pois, uma utopia inatingível. O máximo que a humanidade poderá fazer e deverá fazê-lo, é tornar o desenvolvimento tão sustentável quanto possível, reduzindo-se assim a degradação ambiental, conseqüência inevitável do próprio conceito de desenvolvimento.

Hoje, as repetidas e exaustivas menções a desenvolvimento sustentável tão freqüentes parecem-nos mais tentativas de justificar as conseqüências muitas vezes danosas do desenvolvimento, ocultando-as sob o manto de uma fantasiosa possibilidade de conciliação que, de forma irrestrita, de fato não existe.


Artigo originalmente publicado no Boletim da FBCN - Fundação Brasileira para a Conservação da Natureza. Republicado com permissão do autor.






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