AgirAzul Revista 1992-1998

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Os Encontros do Rio / Comentário

O Encontro dos Povos

por Giselda Castro*

Forum Global 92, "mistura dinâmica de culturas, ideologias e bandeiras", representado por grupos de todas as partes do mundo constituiu-se na mais eloqüente e inquestionável afirmação da consciência vontade política dos cidadá que reivindicam sua participação no OS processo social e, conseqüentemente, nas decisões políticas que afetam o seu destino e determinam o futuro da Humanidade.

Acontecendo simultaneamente à Conferência oficial que se realizava no Riocentro, foi este Forum que salvou bilionário encontro governamental de ser apenas uma lamentável encenação das elites mundiais, empenhadas, mais uma vez, como sempre, em perpetuar a injusta ordem internacional, estabelecida pelos poderosos para servir seus privilégios, com conivência dos governos do 3º mundo. Excetuando algumas declarações de seus delegados, que evidenciaram empatia para com a problemática debatida no Flamengo e também defenderam o estabelecimento de uma ordem mundial mais justa dentre as quais destacam-se as palavras da dra. Gro Brundtland, 1° ministra da Noruega os chefes de Estado reuniram-se para discussões devidamente protocoladas, às quais compareceram previamente decididos nada assinar que os levasse a compromissos objetivos ações determinadas.

Em contrapartida, 18.680 participantes de 7.946 ONGs Organizações Não-Governamentais-, pessoas de todas as etnias, credos, faixas etárias e todos os segmentos da sociedade, inclusive deficientes físicos e homossexuais, acorreram ao Rio de Janeiro, a sua própria custa e voluntariamente trabalharam por 15 dias na elaboração de "Tratados" visando a união de todas as forças vivas ali presentes em compromissos de ação conjuntas ou individuais, dentro dos parâmetros imprescindíveis ao estabelecimento de uma nova sociedade ecologicamente sustentável, economicamente viável e socialmente mais justa.

Dezenas de indivíduos dessas organizações empenhavam-se no Riocentro em pressionar o mundo oficial, trazendo mesmo representantes para debates no Hotel Glória (Flamengo), onde duas vezes ao dia realizavam-se reuniões para informar os participantes do Forum Global dos andamentos da conferência oficial. Aconteceram quatro desses encontros e, segundo declarações de Elin Enges membro do Comitê do Forum Internacional de ONGs e Movimentos Sociais somente a Inglaterra e os Estados Unidos declinaram de participar. Significativamente, receberam esses dois países o 1° e o3° lugar pelo pior desempenho durante a Conferência o 2º coube à Arábia Saudita.

Muito poucos representantes de ONGs tiveram oportunidade de falar por breves minutos nos plenários do Riocentro. Entre esses, duas mulheres Wandhari Mattai, líder africana de Nairobi, Kenia, que representou as ONGs e Belle Abzug, da WEDO entidade feminina que organizou e coordenou os trabalhos do Planeta Fêmea através do IPAC Comitê Internacional de Ação Política (no Brasil sob a responsabilidade de Thais Corral, juntamente com o Movimento de Mulheres na Coordenação Nacional do Forum Brasileiro de ONGs cuja representante é Rosiska Darcy de Oliveira).

A distância de 40 km entre os dois eventos foi deliberadamente planejada para impossibilitar um contato contínuo, livrando as autoridades mundiais da pressão psicológica de milhares de pessoas reivindicando decisões compatíveis com a gravidade da crise planetária econômico/social/política que hoje se enfrenta.

No entanto, em que pese o elevado custo do deslocamento ao Riocentro, aconteceram diversas e expressivas manifestações às portas da Conferência Oficial representantes dos povos indígenas que conseguiram ali alçar sua bandeira com as cores do arco-íris organizações religiosas, feministas da juventude foram presença marcante para trazer à consciência dos governantes a importância da assembléia mundial que se processava no aterro do Flamengo, onde verdadeiramente era realizada o encontro dos povos do planeta

 Terra.

O papel das mulheres, objetivado no Planeta Fê (feminino) Mea (meio ambiente), a maior estrutura de exposições no Forum Global, registrando uma participação ativa de 1500 pessoas, aproximadamente, foi de relevância impar num elenco já tão rico de valiosas representações. Em novembro de 1991, em Miami, no Encontro "Mulheres por um Planeta Saudável" (organizado pela WEDO Organização das Mulheres pelo Desenvolvimento e Meio Ambiente) 1600 participantes de todos os cantos da terra assumiram o compromisso de lutar por um mundo mais justo, indispensável requisito para um planeta sadio. Elaboraram um documento final, "Agenda 21", plataforma para as mulheres na conferência do Rio, que foi anexado aos documentos oficiais da mesma. Baseando-se na afirmativa de que o desequilíbrio de mundo é consequência de um desequilíbrio do Poder, reivindicam sua participação efetiva num mínimo de 40% em todas as instâncias decisórias, de todos os níveis da sociedade.

A constatação de que quanto existem recursos e vontade política o quase impossível torna-se realidade, o papel da mulher e da juventude na construção de uma nova sociedade, o resgate dos valores éticos/espirituais como estruturas básicas para sua concretização, sintetizam osaldo positivo da conferência das ONGs, que conquistaram definitivamente oreconhecimento de seu papel como agentes da História.

O consenso obtido em todos os tratados discutidos, sua elaboração e conclusão, que implicou num trabalho voluntário muitas vezes durante noites inteiras; o entendimento compreensão que reinava entre pessoas, a própria diversidade dos eventos trabalhos, orações, cantos, danças num espírito único de misticismo e pragmatismo operavam o milagre de propiciar uma antevisão do mundo pelo qual lutamos utopia possível que é nosso imenso desafio fazer acontecer.

O cristalino coro de duas mil crianças, que marcou a cerimônia de Abertura do Forum no dia 2 de junho na praia do Flamengo, saudando a chegada do navio Gaia que viera a desde a Noruega trazendo as mensagens de milhares de crianças aos líderes internacionais. O solene bater dos tambores Sagrados da Terra, "simbolizando um contínuo pulsar do coração humano como parte d ritual de cura da nossa terra". A Gota da Esperança, balão de ar quente de 24 metros que viajará ao redor do mundo por dois anos, levando muitas das resoluções adotadas no Forum do Rio. A expressão fisionômica das pessoas que deixavam o aterro ao término de uma noite de vigília oração, irradiando paz e esperança, iluminados pelo brilho® de um sol límpido, prenhe de promessas, foram a eloqüente resposta da comunidade humana planetária ao apelo de Rosiska de Oliveira, Representante do Movimento de Mulheres na Coordenação Nacional do Forum Brasileiro de ONGs.

Conclamou ela a para a Celebração da Esperança ao raiar do Sol no dia da inauguração da Conferência Oficial para que se caminhasse para o mar no gesto simbólico de a ele entregar a esperança de uma mudança civilizatória que corrija os dramas do nosso tempo: o desequilíbrio da Terra, o desencontro das gentes, o descaminho da VIDA.

* A autora é vice-presidente da ADFG-Amigos da Terra Brasil. Contatos pelo telefone/fax (051) 332-8884 ou endereço rua Miguel Tostes, 694 —

90430-060 Porto Alegre, RS, Brasil.






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