AgirAzul Revista 1992-1998

Todo o conteúdo editorial da publicação em papel

AgirAzul 6

Reciclagem do lixo em Novo Hamburgo – Em defesa do reciclão

Por João Ribeiro Teixeira*

Quando no final do ano de 1989, após o embargo judicial do antigo lixão de Novo Hamburgo, a Prefeitura Municipal solicitou o auxílio de José Lutzenberger para buscar uma alternativa à situação criada, colocava-se em prática uma proposta de reciclagem até então testada em escala menor a partir de uma concepção de trabalho evolutivo com utilização de tecnologias brandas.

A idéia era desenvolver um sistema simplificado de reciclagem, com o mínimo de infra-estrutura necessária como galpões rústicos, algumas máquinas e equipamentos acessíveis a qualquer Prefeitura com vontade política de atacar o problema, uma área adequada e principalmente à utilização de mão de obra de catadores autônomos.

 Estes, alheios à burocracia e morosidade da máquina pública, passariam a administrar sua própria capacidade de trabalho e organização, tendo como resultado tudo aquilo que conseguissem selecionar e recolocar no mercado de recicláveis.

À Prefeitura Municipal caberia garantir a infra-estrutura mínima em termos de máquinas e equipamentos, assim como todo o manejo da compostagem da fração orgânica e do aterro sanitário para os rejeitos do processo, complementando desta forma o funcionamento do sistema.

A esta tarefa, de implantar esta unidade que ficou conhecida como Reciclão, uma equipe de pessoas se jogou com afinco, através da Vida Produtos Biológicos sob a orientação permanente da Fundação Gaia – idealizadora do sistema -, auxiliando na organização dos catadores e cobrando providências da Prefeitura Municipal quanto às condições de trabalho e condução do processo.

Hoje, passados quase quatro anos do início deste trabalho, algumas coisas se consolidaram e outras simplesmente ficaram na promessa e nunca aconteceram.

De um lado, o crescimento e fortalecimento da organização dos catadores através da Cooperativa Reciclar, que hoje envolve diretamente mais de 100 pessoas fazendo a comercialização dos materiais de forma centralizada e diretamente com as indústrias recicladoras, através da Cooperativa Reciclar que agora está entrando numa nova fase, a partir do funcionamento da moagem e lavagem de plásticos iniciada recentemente, de busca de mercados mais específicos, com uma maior qualidade e conseqüentemente melhor remuneração.

De outro lado, a total inoperância e incapacidade da Prefeitura Municipal de dotar o Reciclão da infra-estrutura mínima necessária, fruto da falta de vontade e agilidade de uma burocracia pública que na verdade tem responsabilidade pela prestação deste serviço à comunidade e não a assume.

O Reciclão é hoje uma realidade graças ao trabalho da Cooperativa e de algumas pessoas engajadas em sua sustentação, apesar de todos os entraves gerados pela falta de apoio da Prefeitura.

Para que se tenha uma idéia, faz praticamente um ano que não se dispõe de um aterro para colocação do rejeito do processo de compostagem, que vem sendo acumulado no pátio, saturando ainda mais uma área que já é pequena.

 O manejo da compostagem como o revolvimento periódico das leiras, peneiração sistemática do composto, está sendo sacrificado pois além da área reduzida, neste último ano só tem entrado lixo no local sem sair nada de rejeito, colocando o sistema sob risco de entrar em colapso.

 Os novos galpões para armazenagem dos produtos selecionados, prometidos há muito tempo até hoje não foram iniciados, provocando a perda de matérias e reduzindo a qualidade e preços. 

 Apesar de todos estes percalços, a Central de Reciclagem de Lixo Doméstico de Novo Hamburgo é ainda a maior unidade de reciclagem de lixo do Rio Grande do Sul, servindo de referência para inúmeros outros projetos nesta área.


 Como reverter este quadro?

Na verdade, a Prefeitura Municipal de Novo Hamburgo tem perdido uma oportunidade ímpar de assumir uma posição de destaque nesta área, servindo como referencial para outros municípios. Para tanto, é necessário investir no Sistema de Reciclagem e assumir a sua responsabilidade no processo, superando as deficiências, já crônicas.

 Para que se tenha uma idéia, enquanto Novo Hamburgo gasta aproximadamente US$ 160 mil mensais com o serviço de coleta de lixo através de uma empresa paulista, para disposição final do lixo sequer chegamos próximos a 1/10 deste valor.

 De nossa parte, por enquanto, é preciso continuar aprimorando a organização e corrigindo os rumos do sistema, buscando uma maior articulação com o movimento comunitário e ecológico, como forma de exercer cada vez mais pressão sobre a Prefeitura para realmente assumir seu papel neste processo.

 Longe daquilo que muitos Prefeitos sonham, não existem soluções mágicas, projetos salvadores deste ou daquele tipo de usina, tal como uma receita de bolo. O nó da questão dos resíduos sólidos está em seu gerenciamento e para isto é preciso engajamento, vontade política e romper com a inércia da máquina pública.


 * O autor é engenheiro-agrônomo da Fundação Gaia, Porto Alegre.






© 1992-1999 / 2007/2008 / 2024  João Batista Santafé Aguiar - É proibida a reprodução total ou parcial sem permissão por escrito / por email do autor ou detentor dos direitos. AVISO LEGAL - Eventualmente, os endereços informados, tanto os convencionais, como os eletrônicos como páginas web ou endereços de emails, serão os da época da publicação, não sendo mais funcionais, não havendo qualquer responsabilidade do Editor sobre o fato. Estes textos disponibilizados no AgirAzul Revista  foram produzidos nos anos de 1992 a 1998. Pessoas citadas poderão já não representar ou participar das entidades pela qual assinaram ou deram seus depoimentos ou mesmo já terem falecido. Eventualmente na versão para www.agirazul.com.br foram corrigidos erros de grafia e aplicação da língua portuguesa, além de  realizados alguns alertas sobre informações já ultrapassadas pelo tempo.