AgirAzul Revista 1992-1998

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AgirAzul 7

Poluição aérea

Chuva ácida agrava condições de vida em Tubarão

A região de Tubarão, em Santa Catarina, é muito parecida com a de Charqueadas ou Candiota, no Rio Grande do Sul. Por mais que a "estatística” oficial não demonstre, o alto nível de doenças respiratórias e casos de doença grave são habitualmente verificados nestas áreas. Tubarão tem três usinas termoelétricas que produzem, juntas, 450MW e está em construção a Jorge Lacerda IV, que terá capacidade instalada de 350MW. Rogério Bardini, presidente da principal entidade ambientalista de Tubarão, nos conta como é a situação da chuva ácida na região.

Por Rogério Bardini*

Em nossa região, com a extração/beneficiamento e uso do carvão mineral, há uma agressão sistemática e continua ao meio ambiente e, por conseqüência, à toda a população. A qualidade de vida da população do sul de Santa Catarina vem diminuindo a cada dia e as pessoas não se dão conta disso.

Ocorrem vários tipos de fenômenos, um destes fenômenos é a chuva ácida.

O que é a chuva ácida?

Trata-se de um fenômeno que nasce do lançamento, em combinação, de gases sulfurosos (SO2 e SO3) além de outros. No ar, através de reações químicas, eles formam um terceiro elemento: o ácido sulfúrico. Este, quando chove, cai sobre a terra acidificando tudo o que se encontra nela, desde vegetação até solos, águas e bens materiais.

As plantas reagem mais intensamente frente a gases ácidos do que o homem. O SO2 bloqueia principalmente a fotossíntese por destruição das clorofilas. Em conseqüência dessas alterações fisiológicas ocorre a morte ou destruição de grupos inteiros de células, o que se torna visível nas manchas características de necrose, de coloração marrom.

Em 1872, um funcionário público britânico, Robert Angus Smith, impressionado pela rapidez com que as peças de metal expostas ao tempo se oxidavam na cidade de Londres, passou a investigar minuciosamente o fenômeno, chegando à correta e brilhante conclusão de que a chuva ácida se devia à presença de enxofre proveniente da queima de carvão mineral nas fornalhas. A esse respeito publicou um livro com o título Ar e Chuva: Fundamentos de uma Climatologia Química, ao qual ninguém deu importância durante todo o século.

Por que ocorre chuva ácida em Tubarão e região?

As suspeitas recaem, principalmente, sobre as usinas Jorge Lacerda (Eletrosul) e Rede Ferroviária Federal, além de outras empresas que usam carvão mineral como combustível e dos veículos automotores.

Em Tubarão, segundo estudos realizados por técnicos da Superintendência de Controle de Poluição, da FATMA, as três unidades em funcionamento da usina Jorge Lacerda liberam por hora 17 toneladas de SO2 na atmosfera. Somente liberará 12 toneladas de SO2 por hora, o que representará um acréscimo de 76% na poluição do ar causada pela Eletrosul.

Convém lembrar que os filtros eletrostáticos instalados pela Eletrosul, quando funcionam, retém somente as cinzas volantes, não tendo nenhum efeito sobre os gases emitidos.

Tentou-se atenuar a elevação de toxicidade de gases ácidos com a construção de chaminés particularmente altas para que os gases emitidos tivessem condições de se diluírem antes de atuar sobre os organismos vivos nas proximidades do solo. A construção de chaminés mais elevadas para as usinas Jorge Lacerda I e II reduzirá as concentrações de poluentes a nível do solo, mas não será suficiente, por si, para solucionar os problemas integralmente.

A previsão feita por técnicos nas áreas mais elevadas (morros que circundam o município de Tubarão) mostram que os padrões de qualidade serão bastante ultrapassados em condições desfavoráveis.

"A elevação das chaminés, neste caso, não vai atenuar o problema, pois a altura dos morros é superior à das chaminés e o impacto será direto, sem eliminar o problema das chuvas ácidas e neblina", dizem os técnicos da Eletrosul. 

Em Tubarão, como o vento predominante é o nordeste e como as nuvens carregadas com este tipo de chuva podem deslocar-se por até 400km, o fenômeno pode estar prejudicando até mesmo Porto Alegre.

Pesquisa

Como no caso de Smith, nunca houve real interesse por parte das autoridades responsáveis pela questão ambiental em Santa Catarina. Foi necessário que entidades ecológicas de Tubarão tomassem a iniciativa de motivar e auxiliar o Departamento de Engenharia Sanitária da Universidade Federal de SC para que se tivesse em mãos dados reais sobre a ocorrência de chuva ácida no município. Até então, não se tinha nenhuma condição de confirmar as denúncias de ocorrência do fenômeno.

Em 1991, foi desenvolvido um projeto de pesquisa através do qual se treinou moradores da própria comunidade para viabilizar a coleta de amostras. Essa pesquisa foi iniciada em 1990, quando as chuvas ácidas de Tubarão foram analisadas, havendo registros, segundo os técnicos da UFSC, de ph (grau de acidez) de até 3,62, o que caracteriza a chuva ácida.

O que fazer?

Os dados reais existem e a realidade está aí para quem quiser ver. A população tem o direito e o dever de exigir uma melhor qualidade de vida. Basta ter consciência disso e se organizar, exercendo desta forma a sua cidadania.

 Com relação aos órgãos de controle ambiental, estes deveriam exercer rigorosa fiscalização das emissões das empresas e deveriam dar prazos rigorosos para instalação de equipamentos antipoluentes.

Sabemos que foi aplicado um derrame de multas e penalidades às indústrias poluidoras, bem como medidas preventivas para evitar que novas indústrias se localizem em lugares indevidos. No entanto, agravam-se as condições de vida do povo desta região.

Existem órgãos incumbidos de impedir que isto aconteça e de remediar quando lamentavelmente acontece. Sabe-se, porém, que não são os mais fortes nem os mais equipados na luta em favor da vida agredida pela mentalidade do lucro a todo custo. Sabe-se que a decisão contrária à desenvoltura de um grupo econômico esbarra com embaraços e orientações desenvolvimentistas, cegas no malefício social que certos projetos trazem em sua calda. Quem sai perdendo, em geral, é a natureza e o homem. Vitoriosa é a concepção do rendimento da fonte de imposto.

O progresso é uma realidade vital, mas é preciso estabelecer critérios para que este aconteça, respeitando-se, antes de mais nada, a vida.


* Rogério Bardini é engenheiro e coordenador do Movimento Ecológico Tubaronense - MOVET. O MOVET pode ser contactado via Alternex - endereço "movet" ou através da Caixa Postal 1162, 88701-300 Tubarão, SC. Fone/fax: (0486) 22-5941.






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