AgirAzul Revista 1992-1998

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AgirAzul 9

(DES)POLÍTICAS PÚBLICAS

Manifesto sobre a absurda Poda de Árvores em Porto Alegre

O manifesto sobre a Poda a seguir publicado pelo AgirAzul foi distribuído em 2 de agosto aos vereadores porto‑alegrenses.

Por Augusto César Cunha Carneiro*

Neste inverno de 1994, lamentavelmente e por culpa exclusiva da omissão das autoridades municipais responsáveis, observa‑se o recrudescimento da prática destrutiva e ilegal da “poda” — mutilação, melhor dito, — das árvores que embelezam e melhoram a qualidade de vida de nossa cidade. É preciso reagir‑se imediatamente contra este retrocesso, que põe a perder anos de trabalho de educação pública e melhoria da arborização porto‑alegrense.

Em agosto de 1992, os ambientalistas de Porto Alegre foram surpreendidos com um projeto‑de‑lei de um vereador que queria liberar totalmente a poda de árvores na nossa cidade. O projeto tinha sido aprovado na Câmara e só nos restava uma grande mobilização para garantir o veto do Prefeito Olívio Dutra. Foi o que fizemos, um trabalho penoso e intenso para reverter uma situação absurda. Mas soubemos agir e a vitória foi nossa e de uns poucos aliados políticos. Agora, a omissão do Executivo ameaçanovamente pôr tudo a perder.

A situação da arborização de Porto Alegre é sui generis. Uma grande parte é muito bonita, muitas ruas têm árvores quase perfeitas e isso é fruto direto da nossa vigilância e da conquista da lei que proibiu as podas; também é fruto do trabalho de alguns técnicos da SMAM e da consciência de parte da população que nos apóia denunciando continuamente as agressões. Entretanto, de uns tempos para cá, parte significativa da arborização está voltando a ficar horrível, fruto das podas injustificadas e inexplicavelmente  impunes, pois a primeira lei proibitiva é de 1977 e agora parece que muita gente se esqueceu, inclusive a atual administração da SMAM.

Poderíamos falar sobre a arborização da cidade de um modo geral, mas não é o caso; vários pronunciamentos são feitos por “técnicos” sempre com generalizações erradas, destacando somente a “beleza”, a “estética” das árvores e outras futilidades. A arborização urbana é muito mais do que isso. As árvores da nossa cidade cumprem funções importantíssimas para a qualidade de vida da população, retendo poluentes e melhorando o microclima, além de garantir a sobrevivência da fauna silvestre, principalmente aves, no meio urbano. Todas essas funções ecológicas são destruídas pela poda, e é essa a razão — e não meramente a estética — pela qual a poda deve continuar proibida e restrita a casos tecnicamente fundamentados de necessidade para a segurança pública ou patrimonial, exatamente como prevê a legislação ora vigente.

Nos cabe, pois, alertar a sociedade civil, os parlamentares do Município e os atuais administradores do Executivo para o escândalo visível da violentíssima agressão que está sofrendo a arborização urbana de Porto Alegre, por conta de iniciativas equivocadas de moradores dos bairros residenciais e administradores de condomínios que, sem serem educados nem fiscalizados pela SMAM, atacam as árvores das vias e logradouros públicos. Temos notícia de que mesmo algumas multas aplicadas são perdoadas a posteriori, lesando‑se o interesse público, a ordem vigente na letra da lei, deixando‑se de dar o exemplo e desfalcando‑se assim o Fundo Municipal do Meio Ambiente que se beneficiaria do recolhimento das multas, permitindo repor parcialmente o dano causado pelo infrator. Será verdade essa prática? Se for, é um escândalo sobre o outro!

Cremos ser urgente denunciar e agir. A arborização urbana de Porto Alegre é valiosa demais para ficar a mercê dessas agressões continuadas que acabarão por descaracterizá‑la e destruir seus múltiplos valores ambientais e estéticos.

A indiferença da SMAM nos preocupa em demasia, ainda mais que tem sido difícil obter resposta daquela Secretaria aos nossos legítimos questionamentos quanto aos problemas ambientais do Município. Não se trata de “nos metermos” no trabalho da SMAM como parecem crer alguns burocratas feudais, mas sim exercer nosso direito de ver a legislação respeitada e as árvores da cidade devidamente protegidas.

Essa indiferença e falta de interesse na colaboração dos cidadãos não é de hoje a prática lamentável da SMAM. Já em 1992, denunciamos a mutilação de mais de 200 árvores na Av. Bastian, Av. Ganzo, Rua Múcio Teixeira e arredores, episódio inconcebível por estar a vista de todos...menos da SMAM. Denunciamos a agressão várias vezes, sem resultados outros que a irritação dos burocratas. Em maio deste ano, como resultado da inação da SMAM, o crime se repetiu: o mesmo infrator, empregado de um condomínio da Av. Ganzo, destroçãou novamente várias árvores do canteiro central desta e arredores. Desta vez autuado, o infrator não se intimidou e seguiu mutilando árvores a pedido de diversos moradores ignaros da zona (Av. Ganzo, 320; Av. Bastian, 366, p. ex.). Desafiam a SMAM com toda a pachorra possível, como se soubessem da impunidade garantida.

Basta de silêncio. A burocracia municipal não pode ficar sentada carimbando papel ou tomando cafezinho enquanto o patrimônio público representado pela arborização urbana é dilapidado. Exigimos trabalho JÁ, antes que seja tarde.

*O autor é presidente da PANGEA ‑ Associação Ambientalista Internacional, mantenedora do AgirAzul (endereços no Expediente).






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