AgirAzul Revista 1992-1998

Todo o conteúdo editorial da publicação em papel

AgirAzul Zero

Encontro de Presidentes

Uma declaração que unifica o discurso do Cone Sul

Esta é a integra da Carta do Canela dos Presidentes dos Países do Cone Sul com vistas à CNUMAD - Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, assinada na cidade de Canela, no Rio Grande do Sul, em fevereiro (historicamente talvez não passe de mera declaração de intenções):


1. A crise ambiental ameaça a sobrevivência na Terra. Vivemos em um ecossistema cujo equilíbrio é essencial para toda a humanidade. A proteção do meio ambiente e a conservação racional dos recursos naturais exigem o firme compromisso de todos os Estados do mundo para a realização de um esforço coordenado que assegure às gerações futuras a subsistência das condições que tornam possível a vida em nosso planeta.


2. Assumimos integralmente essa responsabilidade comum, conscientes de que a participação para sua realização é diferenciada, porque são distintas tanto a contribuição para a geração dos problemas ambientais como a disponibilidade de recursos financeiros e tecnológicos. O esforço que deverão realizar os países em desenvolvimento requer recursos financeiros novos, adicionais, contínuos e em condições especialmente favoráveis e a transferência de tecnologia ambientalmente saudável nas condições mais convenientes, de acordo com as diferentes capacidades dos países desenvolvidos e dos países em desenvolvimento.


3. O desenvolvimento deve estar no centro das ações destinadas a reverter o processo de degradação do melo ambiente. Tais ações devem enfrentar não apenas os sintomas mas fundamentalmente as causas dos problemas. Para atingir plenamente seus objetivos, os programas ambientais multilaterais têm de definir adequadamente as responsabilidades, respeitar as soberanias nacionais no quadro do Direito Internacional e tornar realidade uma interdependência que garanta benefícios eqüitativos às partes.


4. Convencidos das necessidades de agir conjuntamente, é estéril limitar-se a atribuir responsabilidades pelos danos causados ao meio ambiente no passado, sem recolher das experiências vividas uma lição exemplar. É imprescindível acordar imediatamente fórmulas solidárias que impeçam a reiteração de condutas depredatórias, banam para sempre as atitudes egoístas e displicentes, e assegurem que os projetos contenham avaliações adequadas do seu Impacto ambiental.


5. A comunidade internacional compreendeu que a proteção do meio ambiente e a conservação dos recursos naturais não se opõem ao processo material e ao desenvolvimento econômico. Ao contrário, são conceitos complementares porque não é possível manter a produção de bens se não se protegem os recursos naturais. É necessário um sistema renovado de cooperação internacional para que a um planeta ambientalmente sadio corresponda um mundo social e economicamente justo. É imprescindível um crescimento qualitativo, um desenvolvimento sustentável que satisfaça as necessidades das gerações atuais sem comprometer as opções das futuras. O esforço da comunidade internacional deve visar, não à recriminação, mas à adoção de meios para o desenvolvimento sustentável.


6. Reafirmamos a importância da educação e da formação de uma consciência e de uma responsabilidade públicas no que se refere a todos os problemas no meio ambiente. A participação da comunidade, das forças vivas da sociedade, da juventude, das organizações não governamentais e dos meios de comunicação social deve ser incentivada a fim de aumentar o conhecimento e a prática de padrões de conduta ambientalmente saudáveis.


7. O fortalecimento das infra-estruturas científicas e tecnológicas nos países em desenvolvimento, e a cooperação dos países desenvolvidos para difundir e transferir tecnologias que sejam ambientalmente as mais saudáveis, modernas e adequadas, são parte essencial desta tarefa solidária para a defesa e proteção do meio ambiente.


8. Os entendimentos para atingir os objetivos propostos requerem também a elaboração, o desenvolvimento progressivo e a gradual codificação do direito internacional ambiental. Além das leis que cada Estado aprove, será necessário acordar e aperfeiçoar instrumentos jurídicos internacionais que contemplem a integridade dos recursos, os recursos pertencentes a mais de um Estado e as inter-relações dos atos que os afetem. Esses instrumentos internacionais também devem incluir, entre outros dispositivos, os que permitam estabelecer sistemas de observação ambiental e de cooperação permanente diante das alterações climáticas, da deterioração da camada de ozônio, dos desgastes naturais e outros riscos ambientais. A Conferência do Rio deve decidir a elaboração de uma Convenção codificadora do Direito Internacional Ambiental, que estipule os princípios, determine os deveres dos Estados, das pessoas físicas e jurídicas, defina a responsabilidade internacional nesse contexto e estabeleça a maneira de tornar efetiva essa responsabilidade, para condenar as condutas ambientalmente ilícitas.


9. Consideramos que a economia de mercado dispõe de mecanismos que, eficientemente empregados, podem estimular condutas aquelas que a pesquisa cientifica qualifique como nocivas. No entanto, as forças de mercado, por si sós, não são suficientes para estabelecer o desenvolvimento sustentável. As transações comerciais devem incluir os custos ambientais causados nas etapas produtivas sem transferi-los a gerações futuras. Reafirmamos nosso repúdio à manutenção de sistemas de subsídios que não só desvirtuam a produção e deformam as condições do mercado, mas também tendem a validar práticas depredatórias dos recursos naturais.


10. A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento tem a mais alta prioridade. A Conferência do Rio é uma oportunidade histórica, única e que não podemos perder, para iniciar uma nova etapa de cooperação internacional que se traduza na intensificação da transferência de recursos financeiros e de tecnologia. Unidos aos demais países da América Latina e do Caribe, com os quais adotamos, em março de 1991, a Plataforma de Tlatelolco, procuraremos assentar no Rio de Janeiro as bases sólidas de um acordo internacional que conduza todos os Estados, sem exceção, ao desenvolvimento sustentável e à ação conjunta para a defesa do meio ambiente. 


11. Afirmamos nossa vontade de manter contato permanente entre nossos Governos sobre meio ambiente e desenvolvimento, antes e depois da Conferência do Rio e, pelos meios mais adequados, para organizar e conduzir nossa atuação comum na matéria. Em particular, nesses contatos será analisada a viabilidade técnica e econômica de estabelecer, com o apoio dos organismos internacionais pertinentes, uma rede regional de observação do ozônlo estratosférico, que permita acompanhar, com a precisão necessária, as alterações produzidas na camada de ozônio.


12. A Reunião de Canela dos Presidentes dos Países do Cone Sul e a Reunião de Manaus dos Presidentes dos Países Amazônicos, ambas realizadas a convite do Governo do Brasil, demonstram claramente a vontade política dos países da América do Sul de estabelecer posições comuns para o êxito do Conferência do Rio.


Canela, 20 de fevereiro de 1992."






© 1992-1999 / 2007/2008 / 2024  João Batista Santafé Aguiar - É proibida a reprodução total ou parcial sem permissão por escrito / por email do autor ou detentor dos direitos. AVISO LEGAL - Eventualmente, os endereços informados, tanto os convencionais, como os eletrônicos como páginas web ou endereços de emails, serão os da época da publicação, não sendo mais funcionais, não havendo qualquer responsabilidade do Editor sobre o fato. Estes textos disponibilizados no AgirAzul Revista  foram produzidos nos anos de 1992 a 1998. Pessoas citadas poderão já não representar ou participar das entidades pela qual assinaram ou deram seus depoimentos ou mesmo já terem falecido. Eventualmente na versão para www.agirazul.com.br foram corrigidos erros de grafia e aplicação da língua portuguesa, além de  realizados alguns alertas sobre informações já ultrapassadas pelo tempo.