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AMAZÔNIA

Desmatamento na Amazônia é emergência nacional

Governos federal e estaduais precisam agir imediatamente para conter a perda da maior floresta tropical do planeta.

Criação de áreas protegidas na região pode inibir processo predatório de ocupação e exploração

 

7 abril 2004

Manaus, AM, e Brasília, DF -  Os números oficiais do desmatamento divulgados hoje durante reunião interministerial em Brasília (DF) mostram que as forças de destruição da Amazônia estão fora de controle, exigindo uma ação urgente e imediata por parte do governo brasileiro. Para o Greenpeace, o desmatamento na região é um desafio que precisa ser enfrentado como prioridade máxima sob o risco de se perder, ano a ano, a maior floresta tropical do planeta e toda a biodiversidade que ela contém.

O desmatamento na Amazônia no período agosto 2002-agosto 2003 atingiu 23.750 km², o segundo maior da história – menor apenas do que o recorde histórico de 1995, de 29 mil km². O número é uma projeção feita com base em 77 imagens de satélite da Amazônia Brasileira processadas pelo Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), que representam cerca de 80% da área desmatada. Na soma dos dois últimos anos, quase 5 milhões de hectares de floresta foram completamente destruídos, uma área correspondente a duas Bélgicas – ou o equivalente a mais de 9 campos de futebol desmatados a cada minuto.

Cumprindo o compromisso de transparência assumido pelo governo federal, na quarta-feira passada (31/03), os ministérios do Meio Ambiente e Ciência e Tecnologia colocaram à disposição de entidades de pesquisa e organização não-governamentais, entre elas o Greenpeace, as 77 fotos de satélite para análise. Essas “cenas críticas” cobrem as principais áreas do chamado Arco do Desmatamento. A Amazônia Brasileira como um todo é coberta por 229 imagens de satélite. Ontem (06/04), a ministra do meio Ambiente, Marina Silva, liderou reunião de um dia inteiro com essas entidades e órgãos do governo na sede do Itamaraty, em Brasília, para avaliação dos dados e discussão de medidas e sugestões.

“O último ano do governo Fernando Henrique e o primeiro do governo Lula podem ser chamados de biênio da destruição – o pior em toda a história da Amazônia Brasileira”, disse o coordenador da campanha Amazônia, do Greenpeace, Paulo Adário, que, na reunião, mostrou a relação entre desmatamento e ausência histórica do Estado nos rincões da Amazônia. Um dos exemplos mostrados por Adário é o município de São Félix do Xingu, no Pará, recordista individual de desmatamento em 2003: mais de 133 mil hectares destruídos em um ano, ou 6,19% do desmatamento total nas 77 cenas analisadas. O município também é campeão brasileiro de trabalho escravo, apresenta alarmantes dados de grilagem de terras públicas e de violência (30 mortes no campo apenas nos primeiros seis meses de 2003) (Nota 1). “Tudo isso é exemplo claro da ausência do poder público”, disse ele.

“As forças econômicas que impulsionam o desmatamento são lideradas pela expansão do agronegócios, em particular soja e gado. Tais forças adquiriram dinâmica própria e não mais obedecem a medidas de comando e controle oficial”, disse Adário. “Basta ver que o Mato Grosso – que, sozinho, respondeu por 40% do desmatamento identificado na análise das 77 cenas de satélite – é o estado que, em tese, adotou um sofisticado sistema de controle por satélite desde 1999, que permitiriam ações imediatas contra o desmatamento ilegal (2). No entanto, dois terços do desmatamento ocorrido em 2003 foram feitos sem autorização governamental. Não custa lembrar que o governador do Mato Grosso é o principal produtor de soja do País. Sem real vontade política de efetivamente coibir o desmatamento ilegal, a floresta Amazônica – que é o orgulho dos brasileiros – será substituída por pastagens, áreas degradadas e plantações de grãos destinados à exportação. Será preciso muito esforço – dos governos federal, estaduais e da sociedade civil – para conter esse processo.”

O Greenpeace reconhece o esforço do Ministério do Meio Ambiente de incorporar a proteção da Amazônia ao planejamento dos demais ministérios para reverter o atual processo destrutivo em curso na região. Mas, se o governo como um todo não assumir a proposta da ministra Marina Silva e costurar um acordo com os estados para transformar a proteção da floresta amazônica numa prioridade nacional, Lula poderá deixar um legado trágico.

Independente das medidas anunciadas pelo governo federal há pouco mais de duas semanas (3), o número divulgado hoje é assustador e extremamente preocupante”, disse Adário. “O governo Lula precisa agir imediatamente e implementar o plano de combate ao desmatamento, além de criar áreas protegidas para inibir o processo predatório de ocupação e exploração que ocorre atualmente na Amazônia”.

O Greenpeace considera prioritária a criação de uma rede de áreas em regiões com alto valor de conservação, como a Terra do Meio e Porto de Moz, no Pará, contra atividades destrutivas e de crimes como a grilagem de terras (4). Em 2002, como uma reação tardia às denúncias da extração ilegal de mogno na Terra do Meio, o governo federal encomendou ao ISA (Instituto Socioambiental) uma proposta de preservação para a região. O ISA preparou um mapa estabelecendo uma rede de unidades de conservação em toda a Terra do Meio, incluindo Florestas Nacionais, Terras Indígenas e Reservas Extrativistas. A proposta prevê um processo de planejamento participativo para identificar o zoneamento adequado. Porém, até que o zoneamento esteja completo e seja implementado, é necessário estabelecer uma moratória em todas as atividades industriais. Até hoje, esta proposta está acumulando poeira em alguma gaveta do governo federal.  

NOTAS

 

  • (1) Imagens da divisa de Mato Grosso com Pará, Tocantins e Maranhão mostram que o desmatamento seguiu o mesmo ritmo nos estados vizinhos. “No sul do Pará, a situação é lastimável”, diz o diretor de Recursos Florestais da Fema-MT, Rodrigo Justus de Brito. Imagens de satélite divulgadas em 2003 pelo INPE mostram que a maior parte dos desmatamentos ilegais no estado aconteceu nos arredores da Terra do Meio, uma grande área de floresta relativamente intacta localizada entre os rios Xingu e Tapajós. A região também é caracterizada pela total ausência de governo e marcada pela violência e injustiça social. “Em todos os estados desmata-se à vontade e o quanto se que quer. Não se respeita órgão nenhum e nem a Justiça”, afirmou Justus na reunião no Itamaraty. A pavimentação da rodovia BR-163, ainda por ser decidida pelo governo Lula, poderá ocasionar intenso desmatamento na região, aumentando a exposição da Terra do Meio à extração madeireira destrutiva e à agricultura. Um artigo publicado na revista Science prevê que até 49 mil km2 de florestas poderão ser destruídos nos próximos 25-35 anos pela pavimentação da estrada, e uma área do mesmo tamanho estará sob risco de queimadas.

  • (2) A análise das 77 imagens de satélite da Amazônia revela que o estado do Mato Grosso foi responsável por 40% da área total desmatada. De acordo com a Fundação Estadual do Meio Ambiente (Fema-MT), o desmatamento no estado aumentou 133% de maio de 2002 a maio de 2003 – foram destruídos 1,858 milhão de hectares no período, o equivalente a mais de quatro vezes o território do Rio de Janeiro. Da área total desmatada no Mato Grosso, 555 mil ha tiveram a derrubada autorizada pelos órgãos ambientais. O restante (1.303 milhão de ha) foi desmatado ilegalmente. Tal aumento no número do desmatamento está relacionado, no Mato Grosso, com a expansão da agricultura, impulsionada pela alta dos preços no mercado internacional, e da pecuária. O verde dá cada vez mais lugar a pastos e lavouras.

  • (3) O governo brasileiro anunciou no dia 15/04 uma série de medidas para conter o desmatamento na Amazônia, que prevê, entre outras coisas, maior integração dos diferentes ministérios e órgãos do governo envolvidos com as questões amazônicas. Algumas medidas – tais como o aumento dos recursos destinados à fiscalização e monitoramento (que saltariam de R$ 22 milhões em 2003 para R$ 68 milhões em 2004), o zoneamento ecológico-econômico do Arco do Desflorestamento e a criação de áreas protegidas – podem inibir o processo de ocupação e exploração predatória. Mas a questão central é saber se esse pacote de iniciativas será suficiente para reverter o assalto à Amazônia conduzido pela iniciativa privada. Para o Greenpeace, embora o plano de ação pareça formar um todo coerente de iniciativas e ações interministeriais que pretendem minimizar os impactos do processo de colonização da Amazônia, as verdadeiras causas econômicas e sociais da destruição da floresta continuam a não ser enfrentadas.

  • (4) Com uma riqueza biológica em grande parte desconhecida, a Terra do Meio tem importância crítica para povos indígenas e para a vida selvagem, apresentando alto grau de endemismo e abrigando diversas espécies animais, como onças, jacarés, macacos e tamanduás. Os maiores estoques remanescentes de mogno (Swietenia macrophylla) do Brasil estão concentrados na Terra do Meio e nas terras indígenas adjacentes.

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    Mais informações:

     

    Texto do Greenpeace Brasil


    Última atualização: 06 setembro, 2011 - © EcoAgência de Notícias - NEJ-RS e PANGEA
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