Notas da Agapan
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OS TRÊS PILARES DA AGROPECUÁRIA ECOLÓGICA

Correio: agapan@ax.apc.org

OS TRÊS PILARES DA AGROPECUÁRIA ECOLÓGICA

Celso Copstein Waldemar

Visão sistêmica da agropecuária

A agronomia, assim como outros ramos da ciência está passando por uma mudança de paradigmas. Predomina, no meio acadêmico nacional uma visão reducionista que separa o conhecimento agrícola em compartimentos estanques que pouco ou quase nada interagem entre si. Assim a especialidade Fitopatologia, que trata das moléstias vegetais bem como a especialidade Entomologia Agrícola, que estuda as "pragas" pouco ou nada se relacionam com o tipo de adubação ofertada a planta. Nesta visão também não existe uma interface profunda com a ciência ecológica. Ocorre o estudo, stritu sensu, da agroecologia, também conhecida como agroclimatologia, que trata da influência das variáveis ambientais sobre determinada cultura ou espécie animal como temperatura do ar, fotoperíodo, regime hídrico ou conforto térmico para determinada raça produtiva, por exemplo. Porém o conceito de ecossistema, e por extensão de agroecosistema, não existe no pomar, na lavoura ou no campo assim manejado. Esta postura é conseqüência da transposição do manejo agrícola oriundo do clima temperado (matriz européia/cultura ocidental) para as nossas condições tropicais e subtropicais. E este é o principal motivo do insucesso deste modelo agrícola aqui. Por esta identificação com o solo de elevada fertilidade de lá, com a neve, com o pouco sol e a ausência de chuvas torrenciais no clima da terra de nossos antepassados europeus, estuda-se, aqui, tipicamente, a relação animal-solo-planta-água; procura-se aumentar a produtividade, basicamente com adubos de origem industrial; sem considerar a frágil sustentabilidade dos nossos solos frente as chuvas, evita-se a erosão com práticas de terraceamento ao invés de uma cobertura vegetal permanente; procura-se combater os insetos e moléstias com biocidas ou antibióticos para os animais e não com a restauração do equilíbrio ecológico. Nas nossas condições neo-tropicais um modelo agrícola eficiente, prioriza o processo de geração de recursos, não apenas o recurso em sí. Este conhecimento agrícola reflete uma postura ideológica em que os processos naturais são os principais recursos agrícolas. Sua tecnologia agrícola reproduz a dinâmica e o funcionamento dos ecossitemas naturais Esta visão sistêmica implica na aceitação de mais dois componentes básicos presentes em uma área agrícola/pastoril, além destes 4 citados (animal-solo-planta-água): a sucessão ecológica e a reciclagem de nutrientes. Os recursos naturais, ou seja os produtos biológicos obtidos do meio são oriundos de um processo sucessional na qual a riqueza de espécies e a fertilidade do solo tendem a aumentar até um patamar relativamente estável. Na ausência de um distúrbio externo o ecosistema recupera, através do sistema radicular da cobertura vegetal existente, a grande maioria dos nutrientes solúveis, evitando a sua perda para o lençol freático. Funciona como um sistema de retroalimentação. A vegetação nativa, considerada erva daninha, vista como inimiga da produtividade, quando combatida inicia o desequilíbrio ecológico, com o surgimento da erosão, da perda da capacidade de retenção de água e a ocorrência de explosões populacionais de insetos e o aumento da ocorrência de moléstias. É o início da desertificação . Este processo gera duas importantes conseqüências. Atualmente, no Brasil, devido a erosão agrícola, para cada tonelada de grãos colhidos, dez toneladas de solo são arrastadas pelas chuvas, assoreando rios, lagos e barragens. Com o solo retendo menos água, há o aumento do uso de veneno por parte dos agricultores adeptos da agroquímica e consequentemente ocorre uma maior contaminação dos alimentos. Num sítio na qual não há reciclagem natural, os nutrientes oriundos de adubos minerais solúveis, são facilmente percolados, podendo contaminar o lençol freático com nitratos, p.ex. Em média, nas nossa condições subtropicais, 50% dos destes nutrientes não são absorvidos pelas plantas e desperdiçados. A visão eco-sistêmica da agricultura não considera a vegetação nativa como algo a ser combatida, ela deve ser simplesmente manejada. No momento que o mato, a vegetação ruderal é respeitada, pois vai ser adequadamente manejada, os processos naturais de retroalimentação e de homeostase começam a funcionar. O sítio agrícola perde minimamente os nutrientes adicionados pois as ervas nativas os absorve, já que cobrem uma significativa parte da área cultivada. Com o corte da parte aérea pela roçada, estes nutrientes retornam ao solo através da decomposição da matéria orgânica, tornando o solo paulatinamente mais fértil. A erosão com esta prática reduz-se ao ritmo da erosão geológica. Um ecosistema na qual estão inseridos plantas e animais domésticos com uma finalidade econômica tendem a ser mais produtivos com o manejo da sucessão vegetal. Este processo pode ser exemplificado pela transformação ao longo do tempo de um campo em uma floresta ou uma aérea agrícola que abandonada transforma-se em capoeira. Num pomar assim manejado, p.ex., não existe apenas o parâmetro espacial, a ser avaliado (produtividade por Ha), ocorre também um parâmetro temporal. A intervenção humana neste processo consiste em acelerar o aumento da fertilidade do solo, em acelerar o aumento da retenção da água da chuva pelo solo e diminuir a herbivoria dos insetos e a presença de moléstias a um nível que não cause dano econômico.

Este manejo agrícola, como atividade econômica, possui 2 linhas de trabalho consagradas nacionalmente: *Na primeira, desenvolvido por Nasser.Y. Nasr no Espiríto Santo, a sucessão atinge a etapa campestre em lavouras, hortas e pomares. Caracteriza-se pelo uso intensivo de resíduos orgânicos crús e humificados. * O segundo método, idealizado por Ernest Goetch em Piraí do Sul-BA, com base no saber indígena, a sucessão atinge a etapa de floresta e é mínima o aporte de insumos externos a propriedade. No nosso estado estes sistemas de produção em agroecosistemas nunca foram estudados pelas instituições de pesquisa e extensão, mesmo por que originaram-se fora da academia, mas possuem um profundo embasamento científico (ainda não testado estatisticamente) e elevado conhecimento dos processos produtivos. O primeiro sistema pode ser introduzido imediatamente em áreas agrícolas de produção intensiva, quando o produtor dispor de recursos para roçada, adubação verde e aquisição de rochas moídas ou matéria orgânica (M.O) de origem agro-industrial, rural ou urbana. O uso de adubos de alta solubilidade poderá ser usado pelo produtor, sempre que a demanda de nutrientes externos for superior a aquisição de M.O. Estes adubos solúveis devem ser preferencialmente utilizados em formulações com biofertilizantes foliares o que aumenta a eficiência agronômica dos seus nutrientes. Esta etapa de transição é por nos definida como "Agricultura Sustentável" pois conceitualmente este manejo admite o uso de adubos minerais altamente solúveis, em contraposição a Agricultura Ecológica. Em propriedades onde há extrema dificuldade econômica ou em terrenos erodidos ou abandonados, o método de Ernest Goetch pode ser aplicado. Inicia-se a sucessão vegetal, p.ex. com aipim® feijão-milho®frutíferas de ciclo curto® frutíferas de ciclo ®árvores florestais (madeira de lei). Elas serão plantadas concomitantemente ao manejo da roçada da vegetação nativa, e adubadas com fermentados biotecnológicos.

Trofobiose

A teoria da trofobiose, desenvolvida por Francis Chaboussou apesar de ser conhecida desde a década 60, é raramente ensinada e discutida nas faculdades e orgãos de pesquisa agronômica, pois evidencia os aspectos negativos dos adubos minerais altamente solúveis e agrotóxicos ao metabolismo vegetal; embora seja uma base fundamental para a visão ecológica da agricultura e bastante mencionada por agrônomos ligados ao movimento ambientalista. Dentro dos parâmetros da metodologia científica, este autor interpreta o ataque de insetos e a presença de moléstias como um desequilíbrio nutricional causado por estresse hídrico, agrotóxicos, excesso de adubação ou condições climáticas inadequadas que impedem a síntese de proteínas (proteosíntese). Estes fatores acarretam, no tecido vegetal, o acúmulo de açúcares e aminoácidos solúveis que consequentemente não são transformados em carbohidratos e proteínas (proteólise). A adaptação ao estresse hídrico e outras formas de estresse também é conhecido como o nome de ajuste osmótico. Crescendo em condições nutricionais ótimas, as plantas desenvolvem uma imunidade adquirida a insetos e microorgaanismos.

Fermentados Biotecnológicos

Este é a terceira vertente tecnológica na construção de um modelo agrícola que privilegie o produtor rural e o consumidor (que alimentar-se-á de alimentos sem agrotóxicos) e não a indústria e os vendedores de adubos solúveis, venenos e sementes geneticamente modificadas para resistirem a teores elevados de herbicidas. Trata-se de fornecer compostos orgânicos de pequeno e médio peso molecular: hormônios vegetais (ácido indol acético, giberelinas), vitaminas B1,B2,B6,C,E, aminoácidos, alfa amilase, diversas enzimas, ácidos orgânicos, açucares e outras substâncias biológicas diretamente assimiláveis às plantas, e nutrientes minerais preferencialmente via foliar. Os biofertilizantes fornecem substâncias diretamente necessárias ao metabolismo vegetal, poupando energia endógena para sua produção e liberando-a para o aumento de biomassa A produção destes compostos é realizada pela fermentação de esterco de herbívoros, resíduos de colheita em geral, rochas moídas, melaço e leite entre outros produtos por diversos microorganismos entre eles o Bacillus subtilis, (capaz de sintetizar substâncias antibióticas fungiostáticas e bacteriostáticas) Streptomyces sp., Lactobacillus sp., que sintetizam enzimas e coenzimas, úteis no metabolismo vegetal. E uma tecnologia socialmente, justa pois os fermentados podem ser produzido a nível de propriedade rural. Um destes fermentados, desenvolvido aqui no estado pelo Agrônomo Sebastião Pinheiro e pelo técnico Agrícola Delvino Magro é conhecido por Supermagro e tem uso consagrado, ganhou notoriedade e é conhecido nos países do Mercosul. A eficiência da absorção dos nutrientes minerais adicionados a estes fermentados, utilizados via foliar, no caso N-P-K, chega ser de 1,5 a 30,0 vezes maior do que quando aplicados via solo. A presença de giberelinas em alguns fermentados aumentou o índice de germinação de sementes de mamão e propiciou a quebra de dormência em sementes de Kiwi.

Texto de autoria do Eng° Agrônomo M.Sc.Celso Copstein Waldemar, representante da AGAPAN no Conselho Municipal de Agricultura e Abastecimento de Porto Alegre.


Última atualização: 06 setembro, 2011

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