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FSM - Oficina discute futuro das políticas de águas e florestas:  pressão da sociedade civil é fundamental

De: - EXCLUSIVO - EcoAgência de Notícias
Data: 24-jan-03
Hora: 20:23:59

O fortalecimento do nexo entre conservação das florestas e das águas, a necessidade de reorientar o papel do Estado no planejamento dos múltiplos usos da água, e o “fechamento” da Amazônia como fronteira de recursos naturais, foram apontados como questões fundamentais a serem enfrentadas pelo governo federal nos próximos anos. Essas conclusões fecharam a oficina Gestão da Água e da Floresta: Lacunas, Sobreposições e Políticas Públicas, realizada nesta tarde na PUCRS, durante o segundo dia do Fórum Social Mundial.

Organizada pelo WWF-Brasil, a oficina teve a participação, além de representantes de ONGs, do ex-deputado Gilney Viana, do PT do Mato Grosso, nomeado na semana passada secretário de Políticas de Desenvolvimento Sustentável do Ministério do Meio Ambiente. Viana abriu o evento afirmando que, especialmente na última década, o país “chegou ao topo” em termos de normatização e coerção. “A legislação que trata das águas e das florestas não é mais problema. A questão é a escala de sua aplicação”, afirmou o secretário, citando como exemplo o baixo número de comitês de bacias hidrográficas em operação, que são fundamentais para efetivar a gestão dos rios nacionais.

Citando a insuficiência de comitês de bacias instalados, Viana, cuja Secretaria tem entre suas responsabilidades a implantação da Agenda 21, postulou que o que temos hoje são boas normas e boas “experiências moleculares”, de alcance local, faltando, portanto, políticas públicas que ampliem a escala de implementação dessas experiências.

Tanto Viana quanto a representante do Instituto Socioambiental, Adriana Ramos, afirmaram que, quanto aos recursos hídricos, o problema está no modelo definido pela gestão passada para o setor. Adriana Ramos lembrou que, ao conceder vastos poderes à Agência Nacional de Águas (ANA) e privilegiar a visão da água como commodity, o governo passado esvaziou o papel da Secretária de Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente em relação ao planejamento do setor. Ou seja, o planejamento propugnado pela ANA passou a ser confundido com as possibilidades de exploração do potencial hidrelétrico dos rios e com o cálculo dos ganhos auferidos pela outorga decorrente do uso do recurso.

Heloísa Dias, representante da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica afirmou que, embora até o senso comum seja capaz de compreender o nexo entre florestas e águas, falta aos que trabalham pela conservação de ambos um diálogo mais estreito. “Um dos problemas que hoje temos é a falta de integração dos instrumentos e das políticas destinadas à conservação das águas e aquelas destinadas às florestas”, disse. O Código Florestal (Lei 4.771/65), que nos últimos dois anos foi objeto de um renhido embate no Congresso Nacional, foi apontado como um dos instrumentos fundamentais para conciliar a proteção de ambos.

Fim da abundância

Embora a relação entre águas e florestas tenha inspirado a oficina, o futuro da Amazônia, maior fronteira de recursos naturais do planeta, dominou os debates com os presentes. Para o secretário Gilney Viana, as altas taxas de desmatamento na região vão continuar, pois a lógica da economia que as fomenta é global. “O embate é global, e estar no governo não é suficiente para mudar a correlação de forças”. Por isso, disse Viana, a pressão da sociedade civil continuará sendo fundamental.

O futuro da economia amazônica foi o centro da apresentação do engenheiro agrônomo Paulo Amaral, do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). Pesquisador com trabalhos focados na indústria madeireira da região, ele comparou os ganhos e os passivos gerados pela exploração madeireira sustentável e pela exploração predatória. Defendeu a implementação de políticas que fortaleçam o manejo florestal sustentável, a fim de se instalar na região uma economia de base florestal.

No entanto, a conversão do modelo atual demanda um trabalho árduo. Atualmente, segundo Amaral, 2,5 mil empresas instaladas na Amazônia produzem 90% da madeira do país – há 20 anos, a região produzia 24% - e gera 600 mil empregos. Do montante produzido hoje, meros 5% adotam técnicas e procedimentos de exploração considerados sustentáveis e apenas 1,5% são reconhecidos por certificadoras.

A indústria madeireira predatória na Amazônia tem papel importante na dinâmica do desmatamento que, ao final de um processos que levam no máximo 20 anos, ou gera florestas empobrecidas pela extração seletiva, feita sem critérios científicos, ou propicia a conversão da floresta em pasto. De acordo com o pesquisador do Imazon, 80% dos cerca de 600 mil km quadrados desmatados na região estão entregues a uma pecuária de baixa produtividade.

Já a produção sob manejo sustentável, embora exija investimentos iniciais para implementar os projetos técnicos aprovados pelo órgão ambiental, os ganhos são permanentes, e não declinantes, como ocorre entre a primeira e a segunda década da exploração predatória, conforme demonstram suas pesquisas na região de Paragominas, pólo madeireiro no leste do Pará em franca decadência.

Para a maior parte do setor madeireiro, a Amazônia é considerada uma “fronteira aberta”. A disponibilidade de terras na região acaba por estimular o avanço sobre novos nacos da floresta, o que torna mais rentável hoje produzir sob o modelo predatório, caracterizado pela busca de ganhos mais imediatos. Segundo Amaral, a própria ação governamental tem favorecido essa atitude.

“Hoje é mais fácil obter uma licença para desmatar do que ter um plano de manejo aprovado”, informa, afirmando que a expansão do manejo sustentável dependerá não apenas do comportamento do mercado mas também da intervenção do poder público via políticas. “O fechamento artificial da fronteira para eliminar a abundância de terras e de florestas, a criação de unidades de produção e programas e procedimentos e regras que incentivem o manejo sustentável e a certificação são fundamentais para virar o jogo”, postula Amaral.

Marco Antonio Gonçalves - marcoantonio@ecoagencia.com.br - © EcoAgência de Notícias, janeiro 2003 - http://www.ecoagencia.com.br .


Última atualização: 06 setembro, 2011 - © EcoAgência de Notícias - NEJ-RS e PANGEA
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