A pista de eventos de Porto Alegre

AgirAzul na Rede divulga a íntegra do parecer do Professor Sandor Grehs sobre a construção da Pista de Eventos (e Sambódromo) no Parque Marinha do Brasil em Porto Alegre pela Prefeitura Municipal da mesma cidade.

Por óbices judiciais, a pretendida obra não foi adiante nos lugares até agora lançados pela Prefeitura.

Divulgamos a íntegra do relatório de autoria do Prof. Sandor Grehs, representante da UFRGS no Conselho Municipal do Meio Ambiente, e integrante da Câmara Técnica de Legislação Ambiental onde o assunto foi mais exaustivamente discutido.  O relatório a seguir foi aprovado na Câmara Técnica, mas rejeitado pelo plenário, formado em sua maioria de representantes governistas. Leia com bastante atenção e verifique como a Administração Popular  está administrando o tema. Recomendamos que seja lido e impresso off-line, pois é um arquivo grande. (JBSA)


CONSELHO MUNICIPAL DO MEIO AMBIENTE

CÂMARA TÉCNICA DE LEGISLAÇÃO AMBIENTAL

Relator : Sandor Arvino Grehs

Representante da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, UFRGS

PORTO ALEGRE, 26 DE JANEIRO DE 1998

ASSUNTO : PROCESSO DE LICENCIAMENTO DO LOCAL PARA IMPLANTAÇÃO DE PISTA DE EVENTOS NO PARQUE MARINHA DO BRASIL E RECURSO INTERPOSTO PELA ASSOCIAÇÃO DOS AMIGOS E MORADORES DO MENINO DEUS, PELO HOSPITAL MÃE DE DEUS, PELO RESIDENCIAL GERIÁTRICO MÃE DE DEUS, PELA FUNDAÇÃO ESTADUAL DO BEM ESTAR DO MENOR (FEBEM) E POR VOVÔ CLIN – CLÍNICA GERIÁTRICA LTDA.

1 – INTRODUÇÃO

Em função da decisão do plenário da última reunião do Conselho Municipal do Meio Ambiente – COMAM, realizada em 07 de janeiro de 1998, a Câmara Técnica de Legislação Ambiental recebeu a tarefa de apreciar o assunto em epígrafe.

Os conselheiros integrantes da mencionada câmara técnica realizaram trabalhos individuais de apreciação do assunto em pauta até a data de 19 de janeiro de 1998, quando em reunião com a presença dos representantes da Secretaria Municipal da Saúde, da PANGEA - Associação Ambientalista Internacional e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, foram indicados respectivamente como presidente e relator, o representante da Secretaria Municipal da Saúde e o representante da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Na referida reunião foi deliberado que o trabalho do relator seria apreciado em reunião a ser realizada as 14 horas do dia 26 de janeiro de 1998.

Foram utilizados os subsídios fornecidos pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente – SMAM, pelas entidades que subscrevem o recurso, pelo Ministério Público Estadual e pelos conselheiros que integram essa câmara técnica.

2 – ALTERNATIVAS LOCACIONAIS

A seleção da área correspondente ao antigo estacionamento do MAPA, situada contiguamente ao S. C. Internacional, pertencente ao PARQUE MARINHA DO BRASIL, foi embasada no "Estudo de Localização do Equipamento Urbano PISTA DE EVENTOS, Considerações sobre as áreas disponíveis em Porto Alegre para a Implantação da Pista de Eventos- Estudo de Alternativas de Localização", PMPA / SPM / CPE /UPSE, março de 1997, de autoria do Arquiteto Luiz Carlos Zubaran.

Trata-se de um estudo que não envolveu a participação interdisciplinar e por isso mesmo constitui uma abordagem parcial, sem contemplar a abrangência dos aspectos ambientais, médicos e oposição públicspública, pois considerou apenas três aspectos: centralidade , sistema viário e propriedade.

O Processo Pista de Eventos da Secretaria de Planejamento Municipal N º 2.076553.97.3.000 constitui o inicio das ações orientadas para o licenciamento do local do empreendimento, alicerçado no estudo de localização acima mencionado. Na fls. 02 do referido processo é enfatizado quee : Este equipamento deverá constituir-se em referencial para a população, destacando-se na estrutura da cidade, estabelecendo um pólo de atratibilidade regional. Tal balizamento demonstra a necessidade de alternativas que ofereçam espaço físico disponível, pois o conceito de pólo tem como requisito básico a expansão no sentido de incorporar as áreas adjacentes do entorno, não podendo dessa forma serem localizadas em zonas de congestionamento e saturação do sistema viário , face a ocupação e uso do solo preexistente. Obviamente se torna imperiosa a submissão a condicionamentos ambientais e legais.

Apesar da discordância em relação aos três critérios básicos utilizados, que representam uma avaliação apenas parcial e fragmentada , uma análise das diversas alternativas investigadas, mesmo aceitando com suficientes e válidos os critérios referidos, indica que a área selecionada, situada no antigo estacionamento do MAPA , é a mais inadequada, como será demonstrado a seguir.

2.1 – Porto Seco

O posicionamento assumido é consubstanciado pela seguinte explicitação : Dificuldade de acesso tanto pela deficiência em transporte coletivo, quanto pela sua localização afastada do centro da cidade. Em se tratando de um empreendimento que visa criar um pólo de atração, a justificativa de rejeição é muito frágil, pois é possível agilizar o transporte coletivo com relativa facilidade e o fato de não se localizar no centro da cidade representa um argumento favorável. Cabe questionar ainda que não houve qualquer preocupação em estabelecer negociações visando a parceria com o setor privado, a exemplo de iniciativas exitosas na adoção de praças.

2.2 – Área da Rede Ferroviária

Essa alternativa locacional é também rejeitada, com base na seguinte justificativa textual: Localização privilegiada na cidade , porém apresenta dificuldades de viabilização por ser pertencente a União o que acarretaria em comprometimentos financeiros inviáveis no caso de compra da área, ou em processo lento e de duvidosa exequidade caso se optasse por uma troca de áreas entre a Prefeitura e o Governo Federal .Tal argumentação parte de um preconceito em relação a parcerias entre diferentes níveis de governo, que no entanto ocorrem com a Prefeitura de Porto Alegre em diversas ações com o Governo Estadual e o Governo Federal. A invocada lentidão do processo é improcedente, pois o assunto Pista de Eventos já constitui preocupação da administração municipal desde 1989.

A propósito, a COMISSÃO ESPECIAL CONSTITUÍDA COM A FINALIDADE DE ACOMPANHAR E SUGERIR UM LOCAL PARA A IMPLANTAÇÃO DA PISTA DE EVENTOS, PROCESSO No 2645 / 94, CÂMARA MUNCIPAL DE PORTO ALEGRE, em parecer aprovado em 27 de abril de 1995, na fls. 7, se pronuncia da seguinte forma: Atendendo ao pedido de vários Vereadores, ouvimos o Representante da Rede Ferroviária Federal S / A, senhor Edemar Mainardi, que disse , a nossa idéia é permitir a construção do sambódromo, e por baixo das escadarias, voltado para a Voluntários da Pátria, um espaço onde se fariam lojas, para que a Rede Ferroviária explore essas lojas, através de um comodato de 20, 25 anos, onde teríamos uma receita mensal, exatamente dentro dessas pretensões. Perguntado sobre o interesse da Rede em vender essa área, o Representante da RFFSA respondeu que o valor seria de nove milhões, quinhentos e vinte mil reais... Ainda sobre esta possibilidade de se erguer o sambódromo naquele local, ouvimos Representantes do Hospital Moinhos de Vento, que argumentaram contrariamente a tal pretensão.

Verifica-se pois que havia solução de parceria com a RFFSA, havendo também resistências expressas do Hospital Moinhos de Vento, apesar de que no local selecionado (área do Parque Marinha do Brasil), a distância para o Hospital Mãe de Deus é muito inferior..

2.3 – Restinga

O documento oficial da Secretaria de Planejamento Municipal também descarta essa alternativa com a seguinte justificativa : À semelhança do Porto Seco , esta área também apresenta problemas de acessibilidade. O problema de acesso poderia ser superado com providências referentes a transporte coletivo. Pode-se indagar se esta área, que está merecendo incentivos por parte da Prefeitura de Porto Alegre no sentido de atrair empresas para o distrito industrial, não oferece condições para desempenhar a função de pólo, de conformidade com as aspirações da administração municipal, possivelmente com parceria envolvendo o setor privado. Segundo consta a população da Restinga não foi consultada para se pronunciar com relação a implantação de uma pista de eventos em seu território.

2.4 – Avenida Augusto de Carvalho, 2. 5- Avenida Padre Cacique , 2. 6 – Avenida Diário de Notícias

As três avenidas acima mencionadas foram descartadas porque implicariam em comprometimento da circulação urbana, apesar de que na conclusão da Comissão Especial da Câmara de Vereadores, já referida, na fls. 9, 10, 11 e 12, a Avenida Augusto de Carvalho é colocada como a alternativa locacional mais adequada.

2.7 – Avenida Beira Rio próximo ao Parque Maurício Sirotsky Sobrinho

Essa alternativa foi também rejeitada pelo fato de gerar barreira visual ao Guaíiba , contrariando inclusive a Lei Orgânica do Município que estabelece a preservação da área.

2.8 – Parque Maurício Sirotsky Sobrinho

Trata-se de uma alternativa que foi considerada preferencial para a Prefeitura de Porto Alegre, tendo sido explicitada da seguinte forma : Área bem localizada, com boa acessibilidade e infra-estrutura constituindo-se a área preferencial para a Prefeitura. Apresentou, no entanto, dificuldades para sua viabilização devido a condicionamentos ambientais que levaram a uma ação judicial e, por ausência de EIA /RIMA, houve impedimento de continuidade do processo.

Constata-se pois que devido a problemas ambientais , falta de EIA / RIMA e ação judicial a alternativa foi descartada , apesar de ser considerada como preferencial para a Prefeitura de Porto Alegre.

2.9 – Estacionamento do MAPA

Em função das diversas alternativas investigadas a Secretaria de Planejamento Municipal concluiu que o Estacionamento do MAPA se apresenta com melhor possibilidade de implantação da Pista de Eventos, porque pelo fato de ser Próprio Municipal, diminuirá os custos de implantação e não atrapalhará a cidade que já convive com atividades desenvolvidas no entorno.

2.10 – Inadequação da área selecionada

Verifica-se que a alternativa selecionada apresenta todas as restrições invocadas para descartar as alternativas 4, 5, 6, 7 e 8, com o agravante de se situar muito próximo de complexo hospitalar e casas de saúde, como o HOSPITAL MÃE DE DEUS, RESIDENCIAL GERIÁTRICO MÃE DE DEUS, FUNDAÇÃO ESTADUAL DO BEM ESTAR DO MENOR – FEBEM e VOVÔ CLIN – CLINICA CLÍNICA GERIÁTRICA LTDA.

Deve ser enfatizado que ocorre marcante resistência da população do Bairro Menino Deus, especialmente através da Associação dos Amigos e Moradores do Menino Deus – ASSAMED, cuja mobilização foi muito maior do que a que se verificou em relação ao Parque Maurício Sirotsky Sobrinho, o que levou a Prefeitura desistir de sua área preferencial.

Se faz mister registrar ainda que o MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL havia sido acionado através do Processo 4929 / 95.9 em 24 de abril de 1995, por iniciativa de JOSÉ TRUDA PALAZZO JÚNIOR E AUGUSTO CÉSAR CUNHA CARNEIRO, face a cogitada localização do sambódromo na área do antigo estacionamento do MAPA, que foi integrada ao Parque Marinha do Brasil através da Lei Complementar N º 268 de 21 de janeiro de 1992, Art. 5º. Na mesma solicitação de abertura de Inquérito Civil Público, visando instaurar a necessária Ação Civil Pública, foi denunciada a Secretaria Municipal do Meio Ambiente – SMAM, pelo abandono deliberado de tal área.

O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL na fls. 27, do referido processo toma conhecimento de que a área não é adequada para a construção do sambódromo, através do parecer da Comissão Especial da Câmara de Veradores já mencionada, e promove investigação de denúncia de abandono deliberado pelo Executivo Municipal em 03 de julho de 1995. Na fls. 32 é determinado o arquivamento do inquérito civil.

Os senhores JOSÉ TRUDA PALAZZO JÚNIOR E AUGUSTO CÉSAR CUNHA CARNEIRO, em 08 de novembro de 1995, peticionaram no sentido contrário ao arquivamento e solicitaram ajuizamento de medidas cabíveis para resgatar importante área pública ora efetivamente ameaçada pelo desleixo, deliberado ou não, do Executivo Municipal de Porto Alegre (fls. 39 a 42 do Processo 4929 / 95.9). Na referida petição cabe destacar significativa preocupação que envolve a localização da Pista de Eventos, conforme a seguinte manifestação textual na fls. 41: Ora, a própria CPDC (Coordenadoria das Promotorias de Defesa Comunitária) constatou, ao lidar com o caso da "Pista de Eventos"(Sambódromo), que se aventara já da possibilidade de ali edificar construções absolutamente alheias à função da área verde urbana que deve cumprir o Parque Marinha do Brasil. O abandono deliberado pelo Executivo, portanto, pode claramente ser não somente desleixo, mas estratégia deliberada para sonegar parte do Parque à comunidade, destinando-a para outros fins que sejam politicamente convenientes ao partido político ora gestor do Executivo Municipal. Mais ainda, e pior, pode a área vir a tornar-se novo foco de invasão e favelização, como já atesta a existência de pelo menos uma sub-habitação ali instalada.

O Corregedor – Geral do Ministério Público, Conselheiro JOSÉ BARROCO DE VASCONCELLOS, na data de 26 de dezembro de 1995, emite voto favorável aos peticionários acima referidos (fls. 46 e 47 do processo acima mencionado), porém o Egrégio Conselho Superior do Ministério Público acolheu o arquivamento (fls. 48).

O Sr.Luiz Hideraldo Caron, Diretor do Departamento Municipal de Lixo Urbano – DMLU, foi requisitado pelo Ministério Público para tomar providências no sentido de ser removido o lixo do local (antigo estacionamento do MAPA) em 04 de julho de 1996 (fls. 56 do processo), em 23 de agosto de 1996 (fls. 58) e 06 de novembro de 1996 (fls. 61), não tendo ocorrido qualquer atendimento as sucessivas requisições. Provavelmente o silencio do então Diretor do DMLU ocorreu face aos sucessivos equívocos por parte do Ministério Público em relação ao nome do requerido, que é HIDERALDO LUIZ CARON.

O Ministério Público encaminha ao Sr. Prefeito RAUL PONT o Of. N º 024 /97, com data de 08 de janeiro de 1996 (ocorreu erro na identificação do ano, que obviamente é 1997), requisição sobre a necessidade de remoção do lixo, o que havia sido solicitado ao DMLU por três vezes sem resposta.

Em 31 de março de 1997 o Sr. JOSÉ FORTUNATI, Secretario do Governo Municipal, através do Of. N º 264 / 97 encaminha resposta ao Ministério Público comunicando a suspensão do depósito de lixo de resíduos de material na área contígua ao Parque Marinha do Brasil, ao lado do Sport Club Internacional, com base em laudo da SMAM (fls. 66 do processo). O laudo da SMAM (fls. 67 do processo), com data de 20 de março de 1997, é assinado por HIDERALDO CARON, Secretário da SMAM, e pela Arquiteta MARIA CHRISTINA LÜDKE, Supervisora da SUPPJ, cujo conteúdo integral é descrito da seguinte forma: A SMAM está suspendendo o depósito de resíduos vegetais e providenciando na retirada do material naquela área.

Na data de 25 de abril de 1997 a Secretária de Diligências do Ministério Público, Mara Elaine F. Pereira, na fls. 69 do já mencionado processo se manifesta nos seguintes termos: Percebi que, ao contrário de 03.07.96, o lixo depositado exalava um mau cheiro insuportável.

Em 13 de maio de 1997, através do Of. N º 257 / 97 o Ministério Público informa ao Sr. Darci Campani, Diretor do DMLU, a tramitação de inquérito civil e requisita a limpeza da área contígua ao Parque Marinha do Brasil, ao lado do Sport Club Internacional, tendo em vista os reiterados descumprimentos às requisições constantes dos ofícios de números 442 / 96 – MA, 542 / 96 – MA e 684 / 96 – MA, bem como ao teor do laudo da SMAM (fls. 71 do processo).

Em resposta ao Of. N º 257 / 97, a Arq. Maria Christina Lüdke, Supervisora de Parques, Praças e Jardins, na data de 13 de junho de 1997, através do Of. N º 31 /97 – SUPPJ, se expressa da seguinte forma: Acrescentamos que foram fechados os acessos de veículos àquela área para evitar a ocorrência de novos depósitos por particulares (fls. 74 do processo).

A secretária de Diligências do Ministério Público, Mara Elaine F. Pereira, na data de 24 de junho de 1997 (fls. 76 do processo) explicita o seguinte relato: Quanto à informação constante na fl. 74, de que foram fechados os acessos de veículos à área em questão, constatei que essa é inverídica, havendo duas aberturas na tela, pelas quais passaria, com facilidade, até mesmo um caminhão.

A seqüência de episódios envolvendo a área selecionada para a Pista de Eventos demonstra que eram procedentes as preocupações manifestadas pelos senhores JOSÉ TRUDA PALAZZO JÚNIOR e AUGUSTO CÉSAR CUNHA CARNEIRO.

A inadequação da área selecionada para a Pista de Eventos já fora reconhecida pela administração municipal em 11 de janeiro de 1989, quando o Prefeito Olívio Dutra se dirigiu a Sra Noemy R. Vargas nos seguintes termos: Tomamos conhecimento através de sua carta, em nome dos moradores, sobre os problemas decorrentes da instalação do parque de diversões "ITALPARK" nas imediações do Gigantinho, autorizados pelo contrato assinado por Dona Antonia Collares em 16-12-88... A situação financeira nos leva a seguinte solução: de cumprir o contrato estabelecido, até a data de sua extinção (03-03-89), e depois então, discutiremos com a comunidade a sua renovação ou não, e a utilização definitiva desta área.

Como conseqüência da administração municipal minimizar os problemas enfrentados pela comunidade o Sr Tarso Genro, Secretário de Governo enviou o Of. N º 080 /GS, de 31 de março de 1989 nos seguintes termos: Ficou acertado que será vedada a locação do terreno acima mencionado para circos ou atividades que possam trazer poluição sonora ou de qualquer outra espécie, aos moradores da região, ficando esta área reservada para estacionamentos ou outras destinações não poluentes, à critério do Município.

Constata-se que já em 1989 o fulcro da questão ambiental envolvendo a área selecionada para a Pista de Eventos era o problema da poluição sonora que mereceu manifestação enfática do Sr Tarso Genro, então Secretário de Governo do Município de Porto Alegre.

3 – EIA / RIMA

Os termos de referência do EIA / RIMA, ao se limitarem a uma área previamente definida com fato consumado, retiram desse procedimento ambiental a sua essência que é representada pelas diferentes alternativas locacionais e esvaziam a confiabilidade da solução adotada, ponto nuclear do Inciso IV, Parágrafo 1 º do Artigo 225 da Constituição Brasileira, do Parágrafo 3 º, Artigo 10 º da Lei Federal 6.803 /80 e do Inciso V, Parágrafo 1 º, Artigo 221 da Constituição Estadual do Estado do Rio Grande do Sul.

No item APRESENTAÇÃO (Página 7) do EIA, datado de 25 de agosto de 1997, a empresa MRS se expressa da seguinte forma: Este projeto considera as alternativas anteriormente estudadas pela Prefeitura e destaca a eleita pelo corpo técnico municipal como a mais adequada para abrigar este empreendimento. Tal afirmação não é correta, pois a empresa se limitou apenas a identificar os numerosos problemas, sem todavia oferecer soluções relacionados com a área selecionada.

O curioso é que a empresa MRS na página 16 oferece um subsídio que descredencia o seu próprio trabalho, ao afirmar: ..as diferentes alternativas locacionais devem ser o tema nuclear a ser examinado, discutido e atendido em um EIA, caso contrário tornar-se-á um documento de medidas mitigadoras, desvirtuando do seu objetivo principal... Neste caso, como em muitas vezes, o maior problema encontrado é o enfoque do " fato consumado ", provocando uma fuga do objetivo da avaliação de impacto ambiental (AIA), que é o de subsidiar a tomada de decisão previamente à execução do projeto, no que tange à escollha de áreas.

Caracteriza-se dessa forma uma flagrante falta de consistência e submissão a um fato consumado, sendo EIA uma mera formalidade de homologação de área sem que sejam objeto de investigação outras alternativas locacionais, o que contraria a legislação federal e estadual supra mencionada.

A equipe técnica identificada na página 11 do EIA não evidencia nenhum profissional da área médica, o que constitui uma omissão importante face ao grande impacto sobre hospitais nas proximidades.

Na página 19 existe erro no texto ao se referir ao Mapa N º 06 como área de Influência Indireta, pois na realidade tal mapa se refere a Bacia de Captação Fluvial

O mesmo documento técnico na página 20 menciona explicitamente : No planejamento urbano municipal o terreno em tela está inserido na dinamicadinâmica do parque como local de estacionamento de veículos... ..Logo, o que conclui-se é que o empreendimento traz consigo a utilização de área maior do que aquela delimitada no prohjeto de intenções, devido a dispersão da populacãopopulação no sentido norte, buscando refúgio. Tal afirmação possibilita cogitar de que o empreendimento oferece perigo a população que irá procurar refúgio no sentido norte, ou seja, o Parque Marinha do Brasil. Cabe indagar porque só no sentido norte? A população que reside a leste., nordeste, sul e sudeste não seria também afetada?

Não existe no estudo nenhuma avaliação econômica consistente o que obviamente transforma as medidas mitigadoras em mera listagem genérica de problemas a serem superados, tais como anteparos de isolamento acústico, não especificando métodos construtivos, materiais e qualquer outro subsídio.

A empresa MRS enfatiza especificamente ainda na pagina 20: devido ao fato de inexistirem dados oficiais referentes a este tópico (magnitude econômica do projeto), optou-se pelo simples relato das informações fragmentadas encontradas no material passado à consultora. Isso significa que a consultora não se preocupou em averiguar a veracidade e consistência do conteúdo repassado. Não houve qualquer preocupação da consultora em verificar se os dados eram bons, razoáveis ou ruins.

Quando o EIA aborda o problema da organização logística do projeto transparece claramente que significativa área do parque seria afetada, o que é corroborado pela seguinte transcrição da página 26: considerando-se como usual a estimativa de 50% da área da obra para este fim, o item organização logística aparece como crítico para o projeto executivo, sendo imprescindível que a área a ser utilizada sofra ações de recuperação após o término dos serviços.

Na página 33 é citada a planta 07 como Evolução de Aterros, o que está errado pois a mesma se refere a Ruídos da Região, o correto é planta 05; na página 34 a citação da planta 08 com o Recursos Hídricos também está errada, pois se refere a Carta –Foto de Vegetação, o certo é planta 05; na página 42 é mencionada a planta 09 como de Ruídos da Região, o que configura outro erro, pois a mesma se refere a Identificação dos Usos do Solo, o correto é a planta 07; na página 46 é referida como Carta – Foto de Vegetação a planta 10, que na realidade se refere a Identificação da Áreas Públicas e Destinadas ao Uso Público, a citação correta é a planta 08.; na página 60 é citada erroneamente a planta 04, o correto é planta 10.

Na página 35 a empresa consultora menciona : Embora não existam dados exatos da área drenada pela casa de bombas n º 12, existem fortes indícios de que este sistema já está operando em situação de sobrecarga, uma vez que são constantes os alagamentos do sistema viário. Ora essa manifestação demonstra que a empresa não utilizou as plantas detalhadas da cidade de Porto Alegre, disponíveis na Secretaria de Planejamento Municipal, que permitem avaliar facilmente a área drenada. Deve ser enfatizado que o problema do alagamento será agravado pela impermeabilização da superfície do terreno pelas obras da Pista de Eventos.

No que diz respeito a análise de impactos do empreendimento o EIA menciona :

As medidas mitigadoras sugeridas constituem uma listagem de ações, muitas das quais inexeqüíveis, sem qualquer indicação dos custos envolvidos, cabendo destacar as seguintes:

4 – PROCEDIMENTO DECISÓRIO DA SMAM

A Secretaria Municipal do Meio Ambiente – SMAM recebeu delegação de competência específica para os procedimentos de licenciamento da Pista de Eventos, através de convênio firmado com a FEPAM.

No encaminhamento do processo decisório, que embasou a expedição da AUTORIZAÇÃO PRÉVIA A . P . N º 002 /97, a SMAM informa que uma Comissão Técnica para o Licenciamento das Obras da Pista de Eventos, constituída por oito servidores, sob a presidência do Sociólogo SÍLVIO RICARDO DA CÂMARA BOTELHO, se posicionou com dois votos contra, com três que não opinaram e três favoráveis com condicionantes.

Ao se examinar a documentação do processo de licenciamento constatou-se a falta dos pareceres individuais dos componentes da mencionada comissão, tendo sido solicitadas cópias dos mencionados pareceres, que constituem parte essencial e importante de subsídios técnicos. Houveram manifestações de funcionários da SMAM, incluindo a do Sociólogo SÍLVIO RICARDO DA CÂMARA BOTELHO, de que por decisão e orientação do Sr, Secretário do Meio Ambiente, HIDERALDO LUIZ CARON, não eram permitidas cópias. Após manifestações de inconformidade com tal procedimento, que estava sonegando informações indispensáveis ao trabalho deste relator, o Sr. Secretário da SMAM, através do Of. N º 46 / GS / SMAM, de 20 de janeiro de 1998, liberou para conhecimento os pareceres dos oito servidores, mantendo a proibição de produção de cópias, o que dificultou os trabalhos, exigindo deslocamento e trabalho nas dependências da SMAM.

A análise dos pareceres individuais revelou uma situação diversa da explicitada pelo presidente da referida comissão técnica, cujos detalhes serão apresentados a seguir.

4.1 – Parecer do Eng. Eduardo C. S. Britto, Matricula 12436 –2, de 16-12-97

No parecer do mencionado técnico surgem posicionamentos que revelam inconformidade com o processo decisório, tais como : estou administrativamente livre de solidariedade para com o vinculante encaminhamento técnico – jurídico – administrativo até agora tomado, caso eu o julgue, agora, doutrinariamente inadequado... Não me foi cometido este vínculo processual tempestivamente..... A prévia verificação da adequação locacional se impõe, não somente pela perturbação local e global, como também poderá se impor pela própria funcionalidade da atividade a ser garantida.. ... O empreendedor público tem compromisso profundo com a Comunidade devendo buscar a mais adequada das localizações dentro das áreas possíveis ( aptas / conformes ), considerando o território sob sua competência, não sendo cabível o aspecto de custo como anulador daquele compromisso...... Mesmo que tenha havido participação da própria SMAM, no estabelecimento do Termo de Referência ( TR ) deste EIA, há que constatar que foi um TR extremamente inadequado, na medida que não encomendou a verificação decisivamente irretorquível, da existência no Território Municipal, de Áreas Aptas ( natural e antrópicamente ) e que sejam simultaneamente conformes, para albergar com a máxima habilidade de escolha, obrigatória ao Gestor Público, a Pista de Eventos......Decisão Final 1) Suspender neste momento, a decisão de implantação da Pista de Eventos em qualquer local de POA; 2) Estudar-se com a imprescindível liberdade / obrigação de verificação de áreas ( considerando todo o território do Município ) aptas ambientalmente ( aspectos naturais e antrópicos ) e simultaneamente com legislação / usos vigentes; 3) Verificar alternativas; 4)Definido o local ( medidas mitigadoras )

4.2 –Parecer da Biól. Magda Creidy Satt Arioli, 12295.2 , de 15-12-97

No parecer da bióloga transparece também posicionamento contrário, o que é corroborado por suas manifestações textuais: .o EIA elaborado e apresentado em audiência pública demonstrou com dados relevantes que os aspectos desfavoráveis à instalação da Pista de Eventos no Parque Marinha do Brasil superam os aspectos favoráveis....Somos pelo indeferimento da presente ocupação no local proposto pela PMPA.

4.3 – Parecer do Eng. Mecânico Luiz Augusto Mühle, 12888.4, de 17-12-97

O engenheiro acima mencionado também manifesta sua discordância em relação aos procedimentos utilizados no licenciamento da Pista de Eventos, o que se explicita em algumas de suas manifestações: ...temos a lamentar a forma como fomos envolvidos no caso, já que não tivemos a oportunidade de participar da seleção ( estudo ) do local escolhido.......a Administração Pública "atropelou" comunidade com a imposição do local.....Ficamos com a sensação de que o projeto da pista de eventos não possui sua forma definitiva e sofre constantes mutações.

Tais posições são auto-explicativas não necessitando maiores detalhes sobre a posição contrária ao local selecionado para a Pista de Eventos.

4.4 – Parecer do Eng. Maércio de Almeida Flores Cruz, 60674.9, de 18-12-97

Trata-se de mais um posicionamento contrário ao local selecionado, conforme pode ser detectado pelas seguintes partes do parecer : ..centrar-se primordialmente no Aspecto Locacional, devendo este quesito preceder a todos os demais, por mais importantes que estes outros possam vir a ser ......Todo o processo de escolha do local para a implantação da pista de eventos deve ser retomado desde o início, escolhendo-se primeiro a variável locacional, adotando-se parâmetros verdadeiramente representativos para o balizamento e definição desta escolha ....O que não pode deixar de acontecer é a realização e / ou aprofundamento destes estudos, pois alem de serem instrumentos que darão as respostas técnicas para os questionamentos por ventura levantados, evitarão que entre-se no terreno da "achologia ", no qual qualquer um pode achar que sua interpretação é correta.

4.5 – Parecer da Arq. Ana Maria Godinho Germani, 12681.3

A arquiteta também se posicionou contrariamente a localização da Pista de Eventos no local selecionado, destacando-se algumas de suas manifestações : Assim, não nos parece injusto afirmar que os critérios foram escolhidos a dedo como forma de justificar o que de antemão estava decidido....A respeito do EIA : O impacto do ruído atravessa a Av. Pe. Cacique, seguindo exatamente para seu desenho, tanto para Norte como para Sul mas não ultrapassa o limite do meio fio e assim não atinge nenhum dos tantos prédios residenciais existentes do outro lado da via pública....do nosso relato só pode resultar uma posição, somos contrários à implantação da Pista de Eventos sobre o Parque Marinha do Brasil.

4.6 – Parecer do Eng. Florestal Luis Fernando Barrios, 49837.8, de 19-12-97

O Engenheiro Florestal manifesta uma posição no sentido de que a área de influência suporta o empreendimento, mas exige uma avaliação econômica e um parecer jurídico, o que implica numa posição dúbia, não sendo a favor nem contra, por haver necessidade de informações adicionais.

4.7 – Parecer da Eng. Civil Nara Ione Medina Schimitt, 51202.0, de 19-12-97

A posição da referida engenheira civil também é dúbia na medida do conteúdo de seu parecer: ..seria interessante estudos complementares referentes a este e outras áreas elencadas nos estudos já iniciados por esta PMPA, visando a confrontação de dados de emissão e identificação de áreas de abrangência........Conclusão:..acredita-se que esta seja viável para a implantação da pista de eventos, com restrições...

A engenheira se posiciona no sentido da necessidade de estudos complementares para averiguar as alternativas locacionais, mas acredita que a área seja viável, não tendo convicção plena sobre a adequação da área. Sua conclusão se prende mais a sua crença.

4.8 – Decisão do Secretário Municipal do Meio Ambiente

Face aos pareceres acima referidos a expedição da AUTORIZAÇÃO PRÉVIA A . P. N º 002 /97 não encontra respaldo na Comissão Técnica que examinou o assunto, configurando uma situação deveras constrangedora, face a apresentação do tema na última reunião do COMAM em 07 de janeiro de 1998.

A credibilidade do Sr. Secretário fica prejudicada na medida que ofereceu informações tendenciosas e procurou evitar que o relator tomasse conhecimento do conteúdo dos pareceres técnicos individuais, que representam 5 (cinco) posições contrárias e 2 (duas) posições dúbias, ao contrário do que fora informado.

Se torna difícil entender como uma comissão instituída pela Portaria N º 004 / 98 datada de 12 de janeiro de 1998, portanto posterior a reunião do COMAM de 07 de janeiro de 1998 e a expedição da AUTORIZAÇÃO PRÉVIA (24/12/97), possa ter emitido pareceres na segunda quinzena de dezembro de 1997.

Outro aspecto confuso é que a portaria mencionada indica apenas sete técnicos e não oito conforme foi informado, tendo sido excluído da mesma o nome do Eng. Eduardo C. S. Britto.

A rigor houve expedição da AUTORIZAÇÃO PRÉVIA A . P . N º 002 / 97 com data de 24 de dezembro de 1997 e comunicado de licenciamento, LICENÇA PRÉVIA no Diário Oficial de Porto Alegre de 26 de dezembro de 1997, com a mesma data de emissão de 24 de dezembro de 1997.

Deve ser salientado que LICENÇA PRÉVIA não é sinônimo de AUTORIZAÇÃO PRÉVIA, existindo inclusive implicações jurídicas associadas aos referidos termos. AUTORIZAÇÃO corresponde a ato administrativo discricionário e precário pelo qual o Poder Público torna possível ao pretendente a realização de certa atividade, serviço ou utilização de determinados bens particulares ou públicos, de seu exclusivo ou predominante interesse, que a lei condiciona à aquiescência prévia da Administração, tais como o uso especial de bem público. LICENÇA é o ato administrativo vinculado e definitivo pelo qual o Poder Público, verificando que o interessado atendeu a todas as exigências legais, faculta-lhe o desempenho de atividades ou a realização de fatos materiais antes vedados ao particular. A LICENÇA resulta de um direito subjetivado interessado, razão pela qual a Administração não pode negá-lo quando o requerente satisfaz todos os requisitos legais para sua obtenção.

5 – CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

Face ao exposto conclui-se que existem vícios de origem no processo de licenciamento da Pista de Eventos, desde o não atendimento dos pressupostos de um EIA / RIMA, passando por irregularidades no processo decisório e culminando com confusão entre LICENÇA PRÉVIA e AUTORIZAÇÃO PRÉVIA.

Recomenda-se acolher o recurso interposto pela ASSAMED e demais entidades identificadas no início desse relato, no sentido de ser anulada a AUTORIZAÇÃO PRÉVIA ou LICENÇA PRÉVIA expedida pelo Sr. Secretário do Meio Ambiente.

Sugere-se que o tema Pista de Eventos seja avaliado no contexto do Plano Diretor de Porto Alegre, de modo que sejam contemplados todos os aspectos ambientais que tal empreendimento exige, incluindo a participação efetiva da comunidade a ser afetada.

 

SANDOR ARVINO GREHS

CONSELHEIRO-REPRESENTANTE DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

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